Brasília
– Em uma sessão tumultuada, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ)
da Câmara aprovou hoje (21) o parecer do deputado Osmar Serraglio
(PMDB-PR), favorável à admissibilidade da proposta de emenda à
Constituição (PEC) que transfere da União para o Congresso Nacional a
prerrogativa de aprovar e ratificar a demarcação de terras indígenas.
Em tramitação no Congresso há 12 anos, a PEC 215, de autoria do
deputado Almir Sá (PPB-RR), inclui entre as competências exclusivas do
Congresso Nacional a aprovação da demarcação das terras tradicionalmente
ocupadas pelos índios e a ratificação das demarcações já homologadas.
Estabelece ainda que os critérios e procedimentos de demarcação serão
regulamentados por lei.
Representantes de tribos indígenas de vários estados do país
acompanharam a reunião da CCJ e protestaram todas as vezes que
parlamentares defendiam a aprovação da PEC. A segurança da Casa chegou a
ser chamada para conter os índios que, por várias vezes, se
manifestaram.
Foram mais de quatro horas de debates entre deputados do PT, PV e
PCdoB, contrários à PEC, que obstruíram a votação, e representantes da
bancada ruralista, favoráveis ao texto. Para tentar evitar a votação do
relatório, parlamentares petistas e do PV entraram em processo de
obstrução apresentando vários requerimentos para adiamento da votação.
Contudo, em maior número, os deputados ruralistas conseguiram manter a
votação e aprovar o relatório.
“Essa PEC é um retrocesso não só para os povos indígenas, mas também
para as comunidades quilombolas", disse o deputado Luiz Couto (PT-PB),
autor de um dos requerimentos para adiamento da votação. Segundo ele,
com a aprovação da PEC, se houver um conflito, o governo não poderá
atuar imediatamente, porque será necessária autorização do Congresso.
"Esta PEC vai provocar um clima de violência”, afirmou Couto.
Para o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), a PEC aprovada hoje na CCJ "é
flagrantemente inconstitucional", porque altera o equilíbrio entre os
poderes. "[A PEC] fere o que poderia ser uma clausula pétrea, do direito
da terra para os índios”, acrescentou.
Defensor de um requerimento pelo adiamento da votação por cinco
sessões, Alessandro Molon (PT-RJ) citou a decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) sobre a constitucionalidade da demarcação da Terra
Indígena Raposa Serra do Sol para ressaltar que o processo de demarcação
é legítimo e deve continuar a ser feito pelo Executivo. “É a nova
fronteira agrícola dos ruralistas. Esperamos contar com a mobilização da
sociedade civil para reverter o erro cometido hoje pela CCJ.”
Favorável à proposta, Eliseu Padilha (PMDB-RS) afirmou que a matéria é
constitucional. “Não há ofensa na separação dos poderes", disse ele, ao
explicar que a nação renuncia ao direito de legislar sobre essa questão
e que os parlamentares representam a nação.
O deputado Roberto Freire (PPS-SP) também defendeu a
constitucionalidade da PEC. “Estamos discutindo uma proposta de emenda à
Constituição, que trata de ordenamento e remete essa competência [de
demarcação] ao Congresso Nacional. Temos a tripartição dos poderes e
nada aqui atenta à União, porque somos o Poder Legislativo da União”,
disse.
Mendonça Filho (DEM-PE) criticou a postura petista, que, para ele,
tem o intuito de procrastinar e retardar a aprovação da PEC. "Ao
contrário do que dizem, não existe nenhum propósito de rever os atos
praticados pela legislação que queremos alterar”, disse o democrata.
“Aqueles que estão contra a PEC estão defendendo interesses externos,
e não dos índios. Aqui ninguém é contra índio", ressaltou o deputado
Francisco Araújo (PSD-RR).
Sarney Filho (PV-MA) alertou que a proposta pode provocar mais
violência no campo. “Os fatos nos dizem que, quando há insegurança
jurídica, há violência", afirmou o deputado. “Não gostaria de subir á
tribuna na semana que vem para anunciar violência e mortes”, completou.
Segundo Ivan Valente (PSOL-SP), a PEC aprovada hoje é um retrocesso
no direito dos povos indígenas e tem a ver com a pressão para aprovação
do Código Florestal. "É a mesma turma que está pressionando para votar o
Código Florestal", disse Valente, que apontou "interesses econômicos e
imediatistas para ocupar terras que já estão ocupadas e impedir futuras
demarcações" entre os que apoiam a PEC.
Aprovada a admissibilidade da PEC, cabe agora ao presidente da
Câmara, Marco Maia (PT-RS), criar uma comissão especial para discutir o
mérito da proposta. Se aprovada nesta comissão, a matéria terá que ser
aprovada em dois turnos pelo plenário da Casa, para, em seguida, ser
votada no Senado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário