quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Xinguanos concluem a I Formação em Gestão Territorial


Foram três anos, 150 dias e mais de 700 horas de aula. O último dos seis módulos da I Formação em Gestão Territorial do Xingu terminou nesta terça-feira (21) no Diauarum, Polo base do Parque Indígena do Xingu (PIX), com a apresentação de Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) dos alunos.
A última etapa tratou da cronologia de eventos político-administrativos que levaram à formação do PIX e sua importância para a compreensão dos desafios atuais da gestão do Parque, hoje com uma população de quase sete mil indígenas e 77 aldeias.
Todos os alunos que participaram do curso são “filhos do PIX”, fazem parte de uma geração que nasceu após a demarcação do Parque, em 1961, com o desafio de harmonizar a convivência entre os povos. Pouco a pouco, com a possibilidade de se acessar benefícios por meio de projetos, os povos indígenas começaram a se organizar em associações. A Atix completou 20 anos em 2014, ao longo da última década também surgiram associações específicas das várias etnias que habitam o PIX.
No último módulo, os alunos estudaram as estruturas de organização sociopolítica tradicional dos povos do Xingu e as formas de liderança e organização política da Casa Grande, como os indígenas e indigenistas aprenderam a chamar o PIX, com seus 2,8 milhões de hectares, 16 povos diferentes em uma mesma Terra Indígena.
As últimas aulas foram coordenadas pelo secretario executivo do ISA, o indigenista André Villas-Bôas, que atua em parceria com os índios do PIX desde 1983, quando trabalhou no posto do Polo Leonardo, localizado ao sul do parque. Nessa época a população era 1500 pessoas distribuídas em 16 aldeias. Desde essa época, Villas-Bôas tem acompanhado de perto as mudanças no território xinguano que vão do reconhecimento dos direitos indígenas na Constituição de 1988 às dificuldades atuais para colocar em prática esses direitos.
No Brasil, o tema da gestão territorial em Terras Indígenas virou política pública oficial do governo com a publicação, em 2012, do decreto presidencial de Política Nacional de Gestão Indígena (PNGATI) que institui as regras para garantir e promover a proteção, recuperação, conservação e o uso sustentável dos recursos naturais das terras e territórios indígenas.
Na última etapa da formação os alunos analisaram o Plano de Gestão Territorial da Terra Indígena Wajãpi, no Amapá, uma das 12 TIs que já definiram um documento de governança, linhas de trabalho e objetivos para o futuro de suas terras e seu povo.
Discutiram também o documento base para o Plano de Gestão Territorial do Xingu, que está em fase de elaboração. Entre 2012 e 2014 foram realizadas oito reuniões nos quatro polos bases do PIX para discutir a estrutura de governança e de tomadas de decisões para o Plano. Durante o curso, os alunos analisaram o documento que está sendo construído pelas lideranças de cada etnia do PIX, por representantes da Atix, do Instituto de Pesquisa Etnoambiental do Xingu (Ipeax), do ISA e da Funai.

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Jovens indígenas se destacam na arquearia profissional


Do arco e flecha de madeira convencional da floresta ao equipamento profissional de tiro com arco. Apostando na habilidade de jovens índios com os instrumentos de caça, a organização não governamental Fundação Amazonas Sustentável (FAS) criou o projeto Arquearia Indígena, com o sonho de levar jovens às Olimpíadas. Neste final de semana, seis indígenas participam de campeonato nacional em Maricá, no Rio de Janeiro, com bons resultados para comemorar.

Um das estrelas é Inha, de 14 anos. Ele tem ocupado as primeiras colocações no ranking nacional infantil e é uma das promessas. Da etnia Kambeba, do Baixo Rio Negro, o menino, cujo nome significa Coração, é tímido. Saiu da aldeia, na desembocadura do Rio Cuieiras, direto para um centro de treinamento em Manaus, onde se prepara fisicamente com musculação, recebe atendimento médico e nutricional, frequenta a escola e dá até 300 tiros por dia.

A preparadora física e caça-talentos que descobriu os jovens, Márcia Lot, explica que os jovens índios do projeto são tímidos, pois deixaram suas aldeias natal há um ano e não estão acostumados com multidões. Márcia percorreu aldeias onde sequer falavam português atrás de arqueiros entre 14 e 19 anos. Uma menina também foi selecionada.
“É um projeto de mudança, de inclusão social, de resgate de autoestima, que visa a salvar o jovem”, disse. “Todos eles são arqueiros desde os 3 anos de idade. Eles caçam bichos, como cotias e pescam com o arco”, contou.  Ela selecionou a equipe entre 320 jovens arqueiros da região. “Força, resistência, foco e mira eles têm”, avalia, otimista, a preparadora.

Outra aposta é Yagoara, também da etnia Kambepa. Márcia Lot conta que desde a aldeia, Dream, como é chamado pelo grupo, se destaca. Lá, além de arqueiro, era um grande caçador. “Saímos uma vez juntos pela floresta para caçar um porco do mato. Ele passava a mão no chão e reconhecia o cheiro, indicando o rastro. Esperamos cinco horas. Eu desisti. Ele, não. Três horas depois, Yagoara voltou com o porco e garantiu alimentação da aldeia por três dias”, relembra.

A persistência dos jovens, a resistência e a capacidade de concentração são as características que impressionam o técnico da equipe, Roberval Santos, da Federação Amazonense de Tiro com Arco. Ele explica que ainda é muito cedo para pensar nas Olimpíadas de 2016, mas que com treinamento os jovens, talvez, tenham chance em 2020. “As pessoas podem achar que [ser índio] é uma vantagem. Mas é bem diferente, porque o arco nativo não exige um compromisso, é lúdico. O arco de competição é treinamento de longo prazo, físico e psicológico”, explicou. Em média, os jovens atletas  treinam por uma hora e trinta minutos em escolinhas.

Atento aos atletas do Rio Negro, está Marcos Vinícius D'almeida, de 16 anos, considerado um fenômeno na arquearia. Ele conquistou recentemente a prata nos Jogos Olímpicos da Juventude Nanquim 2014 e é aposta do Brasil nas competições internacionais. Para ele, os jovens indígenas têm a mesma chance que os que se dedicam ao esporte. “Não sei até que ponto isso é vantagem ou não. Mas quanto mais gente praticando, melhor”, disse.

O projeto da Fundação Amazônia busca valorizar também a diversidade cultural e resgatar a autoestima dos índios. “Nossa ideia é usar o esporte como ferramenta de educação. Dar instrumentos para que busquem seus objetivos, seja quais forem, e até voltar para aldeia”, acrescentou Marcia.
Fonte