quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Guarani Kayowá iniciam ritual de morte por terra e identidade



Para se defenderem, índios estão dispostos a morrer. "O que eles reivindicam não é a propriedade, é o pertencimento. A terra não é posse, não se troca por dinheiro, não serve para especular. Serve para você saber quem você é.” A partir desse trecho, retirado do artigo O fio que dá sentido à vida, da psicanalista Maria Rita Kehl, o apelo dos Guaranis-kayowás pode ser ainda mais entendido pela sociedade brasileira.
Em cumprimento a quatro decisões judiciais de reintegração de posse contra os indígenas, expedidas na quinta-feira, 12, que obrigam mais de 5 mil indígenas a desocuparem fazendas do sul do estado, agentes da Polícia Federal afirmaram, em reunião com entidades defensoras dos direitos humanos, que realizarão o despejo da comunidade no próximo dia 18 de dezembro.
Mesmo com a pressão, os Guarani não hesitaram em ser resistentes. Pertencentes das terras da Guarani Ñandeva do Tekoha Yvy Katu, fronteira do Mato Grosso do Sul com Paraguai, os índios reafirmaram, em carta à sociedade brasileira, que não deixarão a terra reconquistada, e resistirão até a morte para defendê-la.
Diante da afirmativa de que irão lutar e resistir ao envio de forças policiais, os guarani ressaltaram que já começaram um ritual religioso raro que diz respeito à despedida da vida da terra, em outras palavras, estão se preparando para morrer.
Na carta, eles pedem que sejam enterrados em sua terra e que o Estado se responsabilize em cuidar das crianças e idosos que sobreviverem. "Solicitamos ainda à presidenta Dilma, à Justiça Federal que decretou a nossa expulsão e a morte coletiva para assumir a responsabilidade de amparar e ajudar as crianças, mulheres e idosos sobreviventes aqui no Yvy Katu que certamente vão ficar sem pai e sem mãe após a execução do despejo pela força policial”, expõe o texto.
De acordo com o secretário executivo do CIMI, Cleber Buzatto, duas questões precisam ser urgentemente feitas. "A primeira é dar seguimento ao procedimento de demarcação da referida terra indígena, procedendo a homologação e as devidas indenizações aos não-indígenas proprietários de títulos de boa fé. A segunda é acionar os advogados da União para apresentação de recursos a fim de caçar as decisões judiciais favoráveis às reintegrações de posse contra os Guarani”, defendeu.
Em relação ao Leilão da Resistência, evento que vendeu gado, aves e soja para financiar seguranças armados contra indígenas, arrecadando R$ 1 milhão, Cleber declarou que esse leilão é outro instrumento utilizado contra os povos indígenas. "O leilão é mais um instrumento intimidatório utilizado pelos fazendeiros invasores de terras indígenas no Mato Grosso do Sul. De acordo com o próprios organizadores, o leilão teve a pretensão de arrecadar recursos financeiros para financiar ações milicianas contras os povos indígenas naquele estado”, denunciou alertando para o verdadeiro objetivo do evento.
Os índios estão sendo despejados em razão da valorização das terras, que possuem altas camadas de minério. Os latifundiários têm o poder de aprovar leis, bem como de passar por cima delas. Então, faz-se mais que necessário exigir que o governo federal demarque as terras dos Guarani Kaiowá em caráter de urgência, antes que aconteçam genocídios e suicídios, fazendo com que a comunidade indígena brasileira perca de vez sua identidade.
Fotos: Egon Heck / CIMI

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Estado altera fundo que permitirá compra de fazendas para índios

Criado no ano passado, o Fundo Estadual de Terras Indígenas (Fepati) pode, agora, ser regulamentado e, assim, contribuir para a solução dos conflitos por terra em Mato Grosso do Sul, segundo reportagem na edição de hoje (12) do jornal Correio do Estado. O governador André Puccinelli (PMDB) encaminhou ontem, à Assembleia Legislativa, uma mensagem propondo a reestruturação do fundo.
Caso as mudanças propostas pelo governo estadual sejam aprovadas, a União terá como depositar, por exemplo, os R$ 30 milhões que o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo disse ter disponível para resolver os conflitos envolvendo indígenas no Estado.
Conforme a reportagem de Patrícia Belarmino, na mensagem encaminhada ao Legislativo estadual, o governador propõe um teto maior para aportes financeiros no fundo. Originalmente, a lei que criou o Fepati autorizava o Executivo a abrir crédito especial no orçamento até o limite de R$ 500 mil para a injeção de verba no fundo. Diante da disposição da União em resolver os conflitos agrários em MS, a proposta prevê que o aporte financeiro suba para R$ 200 milhões.
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Bancada ruralista tem maioria na comissão que vai discutir demarcação

 A maioria dos integrantes da comissão especial da Câmara que vai discutir a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que transfere do Executivo para o Congresso a demarcação de terras indígenas é integrante da bancada ruralista, inclusive o relator --Osmar Serraglio (PMDB-SC).
A comissão será presidida pelo deputado Afonso Florence (PT-BA), que já foi ministro do Desenvolvimento. Os trabalhos da comissão serão iniciados na próxima terça-feira, mas serão suspensos no recesso parlamentar, que começa no dia 23.
Florence disse que vai tentar "criar um ambiente político para a expressão das diferentes posições" em busca do consenso possível. "A indicação é feita pelos partidos, e eu tenho que conduzir a comissão considerando as diferentes posições presentes", afirmou.
"É uma comissão empossada e vamos trabalhar buscando reduzir as zonas de atrito e buscar uma solução compatível com o interesse nacional, preservando os interesses indígenas, ouvindo os produtores (rurais) e buscando a mediação necessária", completou. O relator disse que é preciso ter coragem para discutir o tema.
"O mais desafiador, provavelmente, será a questão da manifestação do Congresso em relação à criação de cada reserva (indígena). Isso provavelmente vai acirrar os ânimos", disse. "Quem abre a Constituição vê que, neste País, para colocar uma usina hidrelétrica ou extrair minério em reserva indígena, quem autoriza é o Congresso Nacional, sem sanção da Presidência da República. Imagina se o Congresso não tem atribuição para estabelecer demarcação de terra indígena", ressalta.
A eleição do comando da comissão especial foi feita com segurança reforçada, diante da presença de indígenas e de agricultores com camisetas da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária. Os produtores rurais vestiam camisetas da CNA com as inscrições: "Onde tem justiça tem espaço para todos".
Indígenas levaram cartazes com fotos de violência contra os índios e com a frase "Congresso: respeite os indígenas". Também distribuíram um manifesto, em inglês e espanhol, com críticas à construção de hidrelétricas nos limites de terras indígenas.
Houve bate-boca apenas no final da reunião. Integrante da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas, o deputado Padre João (PT-MG) disse que essa proposta não deve avançar. "A instalação dessa comissão especial não pode significar uma derrota dos povos indígenas. Não existe nenhuma política pública sem primeiro garantir a terra."
Povos indígenas que acompanhavam a sessão chamaram alguns parlamentares de assassinos. O governo é contra a proposta.
Atualmente, a demarcação é feita pela Funai (Fundação Nacional do Índio), antes da palavra final do Planalto. Os ruralistas querem tirar os poderes da fundação por acusá-la de fraudar laudos e inflar conflitos entre índios e produtores. Os indígenas também estão descontentes com o órgão e reclamam da demora nos processos de demarcação. 
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quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

O silêncio das autoridades públicas diante de afrontas aos direitos constitucionais



Realizou-se no dia 7 de dezembro, em Campo Grande (MS), o chamado “leilão da resistência”. O evento (que teria o objetivo de arrecadar dinheiro para a contratação de seguranças armados - diga-se pistoleiros - e atacar comunidades indígenas) foi promovido, com ampla divulgação na mídia e internet, pela Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul), Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul) e, além delas, contou com o apoio e presença de parlamentares, especialmente aqueles vinculados à bancada da agropecuária (ruralistas) do Congresso Nacional.

Os propósitos das entidades ruralistas, de mobilizar "produtores rurais" contra os povos indígenas que lutam pela demarcação de suas terras, bem como seu potencial para incitar a violência direta contra estes povos, vinham sendo denunciados há mais de um mês por organizações da sociedade civil e por lideranças indígenas.

São tão suspeitas as razões para esta iniciativa que Kátia Abreu (presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA - e senadora pelo PMDB) apressou-se em afirmar que não serão criadas milícias e nem adquiridas armas com os recursos arrecadados pelo leilão. A defesa veemente e o uso destes termos indica que esta possibilidade existe, posto que foi pensada e ventilada e precisou ser rebatida. E os recorrentes eventos de violência contra os povos indígenas, envolvendo armas de fogo e jagunços encapuzados já são, por si só, um perigoso indício do que pode vir a ocorrer em nosso país depois destas iniciativas com caráter público, no entanto marcadamente criminosas.

Considerando ser uma ação que põe em risco a segurança e a vida dos povos indígenas e acolhendo uma ação impetrada pelo Conselho da Aty Guasu e Conselho do Povo Terena, em 4 de dezembro de 2013, a juíza Janete Lima Miguel, da 2ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande, determinou que o leilão não fosse realizado. Na decisão, ela argumenta o que se denunciava, ou seja, que o leilão “tem o poder de incentivar a violência (…) e colide com os princípios constitucionais do direito à vida, à segurança e à integridade física”. E conclui ainda que “esse comportamento por parte da parte [fazendeiros] não pode ser considerado lícito, visto que pretendem substituir o Estado na solução do conflito existente entre a classe ruralista e os povos indígenas”

A 4ª Vara da Justiça Federal de Campo Grande (MS), depois de acionada pelos representantes dos ruralistas, liberou (no final da noite do dia 6) a realização do tal leilão da resistência. Os indígenas recorreram junto ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) e, em caráter liminar, o desembargador Lionel Ferreira manteve o leilão desde que as três condicionantes impostas pela Justiça Federal de Mato Grosso do Sul fossem adotadas: 1. O dinheiro arrecadado com o leilão será depositado numa conta judicial e controlado pela Justiça; 2. Os leiloeiros deverão discriminar os nomes dos arrematadores e os valores pagos; 3. A utilização dos recursos arrecadados com o leilão só poderá ser feita depois de a Justiça ouvir o Ministério Público Federal (MPF) e as organizações indígenas Conselho da Aty Guasu e Conselho do Povo Terena.

O que mais chamou atenção, no caso desse leilão criminoso foi o silêncio absoluto do governo federal, especialmente do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso, da presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Maria Augusta Assirati, da Ministra da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário, e dos integrantes da Secretaria Geral da Presidência da República, onde estão empoleirados, além do ministro Gilberto Carvalho, o senhor Paulo Martins Maldos, que durante décadas acompanhou toda espécie de violações aos direitos indígenas e hoje, no governo, silencia diante de uma iniciativa que abertamente convoca setores da sociedade civil a unirem-se para angariar fundos específicos e com isso combater direitos indígenas resguardados pela Constituição Federal.

Esses representantes do governo federal são omissos quanto ao leilão criminoso e igualmente responsáveis por toda e qualquer prática de violência que vier a ocorrer contra as comunidades e lideranças indígenas. Lamentavelmente ações de violência passaram a acontecer de forma mais intensa nas últimas semanas em Mato Grosso do Sul, onde lideranças Terena, Guarani e Kaiowá estão sendo ameaçadas de morte e sofrendo atentados. E, no caso do leilão dos ruralistas não há, por parte dos integrantes do governo, como tentar justificar de que não sabiam de nada, uma vez que o evento foi amplamente divulgado pelos meios de comunicação e anunciado no Congresso Nacional por parlamentares que compõem a base de sustentação do governo federal. Além disso, jornalistas de diferentes agências de notícia informam, nas reportagens divulgadas sobre esse absurdo leilão, que procuraram escutar instâncias do governo, mas que, apesar de inúmeras tentativas não obtiveram sucesso.

Este fato se soma a tantos outros e demonstra que no governo da presidente Dilma os “senhores do agronegócio” estão muito à vontade, dando as cartas em um perigoso jogo no qual se busca barganhar e violar as regras constitucionais. Ao silenciar, o governo compactua com as ofensivas dos ruralistas contra a vida dos povos indígenas, estes que historicamente são discriminados, perseguidos, ameaçados, vitimados por doenças e têm suas lideranças assassinadas em emboscadas, tocaias e em ações de setores que tomam nas mãos o que consideram ser a “justiça”.

O governo assume, neste caso, uma atitude omissa em relação aos povos indígenas, que mais uma vez encontram-se ameaçados. E, em relação às terras que estão sendo identificadas como de ocupação tradicional indígena, o governo federal tem se negado ao cumprimento de suas atribuições de proteger e fazer respeitar os bens da União. Vale ressaltar que o Art. 20, XI da Constituição Federal estabelece que "são bens da União as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”. Assim, além da grave omissão diante de um risco concreto de prática de crimes contra a vida dos indígenas, as autoridades (no exercício do poder) praticam crime de improbidade, já que é sua obrigação constitucional fazer a defesa dos bens públicos, que precisam ser zelados, respeitados e protegidos.

E se – nos jogos de interesses dos governantes e nos discursos desenvolvimentistas tão propagados na atualidade – a vida das pessoas, comunidades e povos indígenas não têm importância política, jurídica, econômica, as terras por eles ocupadas (ou a serem ocupadas) deveriam ser prioridade das autoridades federais uma vez que (elas - as terras) constituem-se em importantes fontes de riquezas para o país, especialmente pelo potencial energético, ambiental e mineral. O governo, ao permitir que grileiros, fazendeiros e empresários explorem, depredem e dilapidem os territórios indígenas, pactua com os crimes contra o patrimônio público, contra a sociedade, contra o país.

Chama igualmente atenção o fato de não ter havido, de outras instituições ou poderes do Estado, manifestações públicas e até jurídicas contrárias ao leilão criminoso dos ruralistas. E não se pode deixar de lembrar que os discursos difundidos pelos meios de comunicação e redes sociais foram proferidos pelos representantes dos setores do agronegócio e por parlamentares da Câmara dos Deputados e Senado, bem como por deputados e vereadores nos estados de Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.

Apesar dos conteúdos agressivos e que instigavam a prática de violência contra os povos indígenas, quase não se ouviu de personalidades, inclusive eclesiais, como do arcebispo de Campo Grande (MS), e de representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação dos Juízes para a Democracia (AJD), posicionamentos de repúdio ou contestação ao leilão e seus proponentes e incentivadores.

Foi necessário às organizações indígenas (Conselho da Aty Guasu e Conselho do Povo Terena) ingressarem com uma ação judicial solicitando o cancelamento do leilão e, com isso, impor que houvesse (contra ou a favor) uma manifestação de um dos poderes públicos, o Judiciário. Somente depois desta ação se conseguiu, ao menos em parte, evitar que as organizações dos ruralistas, com o aval de parlamentares e a omissão do governo federal, pudessem livremente angariar e utilizar dinheiro deste leilão para “segurança privada ou milícias” - o que resultaria na intensificação das ameaças, dos ataques e, consequentemente, dos assassinatos de indígenas em Mato Grosso do Sul. Também, em função da mobilização indígena, se escancaram interesses e iniciativas que violam e contrariam nossos mais caros princípios de justiça e humanidade estabelecidos na Constituição Federal e num conjunto de acordos e convenções internacionais dos quais o país é signatário.

O que está em jogo, neste caso, não é o fato de liberar ou coibir um simples leilão promovido por corporações rurais. Está em jogo o estabelecimento de limites para ações individuais e coletivas que denotam uma vontade de fazer justiça com as próprias mãos. É uma luta em torno de limites tão caros a um regime democrático e diz respeito, também, às premissas da justiça e da dignidade humana, que não podem e não devem se dobrar ao capitalismo e aos ditames autoritários de quem detém o poder e o dinheiro.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Durante manifestação, indígenas entregam carta a Dilma e Cardozo

Cerca de 1.300 indígenas protestaram contra a alteração do processo de demarcação de terras indígenas, em Brasília, nesta quarta-feira, 4.Houve confronto e ao menos três indígenas ficaram feridos e foram levados ao hospital. Uma carta pública à presidenta Dilma foi apresentada.

A marcha, organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e pariticipantes da Conferência Nacional de Saúde Indígena, se dirigiu ao prédio do Ministério da Justiça. Os indígenas esperavam ser recebidos pelo ministro José Eduardo Cardozo, que não apareceu. Uma carta foi entregue a um assessor da casa. Os manifestantes exigiram uma audiência com o ministro, e frisaram a posição contrária do movimento indígena à minuta de portaria, anunciada por Cardozo, propondo mudanças no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas.


Leia a íntegra da carta dos indígenas:
CARTA PÚBLICA DOS POVOS INDÍGENAS DO BRASIL À PRESIDENTA DILMA ROUSSEFF  DURANTE A V CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE INDÍGENA
À Excelentíssima Senhora
Dilma Rousseff
Presidenta da República Federativa do Brasil
Brasília-DF


Senhora Presidenta:

Nós, povos indígenas de todas as regiões do Brasil, mobilizados por ocasião da V Conferência Nacional de Saúde Indígena, realizada em Brasília – DF, entre os dias 02 e 06 de dezembro de 2013, entendendo que não faz sentido discutir a saúde e outras políticas públicas específicas e diferenciadas voltadas a nós se não é garantida a demarcação e proteção dos nossos territórios, queremos nos dirigir a seu governo e ao parlamento brasileiro, manifestando a nossa indignação e repúdio contra as distintas medidas legislativas, jurídicas e político-administrativas que ambos os poderes vêm trabalhando em visível acordo para restringir e suprimir os nossos direitos originários assegurados pela Constituição Federal e reconhecidos pela legislação internacional vigente.

Destacamos dentre todas essas medidas as Portarias 419/2011 e 303/2012; o Decreto 7957/2013; as PECs 215/2000, 237/2013 e 038/1999;  o PL 1610/1996 e o PLP 227/2012; e, finalmente, a Minuta de Portaria anunciada pelo Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, propondo mudanças no procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas.

Nós sabemos senhora Presidenta que todos esses instrumentos buscam inviabilizar e impedir o reconhecimento e a demarcação das terras indígenas, reabrir e rever procedimentos de demarcação de terras indígenas já finalizados; e facilitar a invasão, exploração e mercantilização dos nossos territórios e suas riquezas. Por isso reiteramos o teor de todos os documentos que as distintas mobilizações dos nossos povos e organizações tornaram públicos e encaminharam para seu conhecimento nos últimos anos. No caso da minuta de Portaria, entendemos que foi elaborada para inviabilizar de vez a demarcação das nossas terras, visando favorecer os interesses do latifúndio, do agronegócio e de outros capitais (mineradoras, madeireiras, agroindústrias, empreitas etc.) interessados nesses territórios. Com essa perspectiva, presidenta Dilma, lamentavelmente o seu governo poderá passar para a historia como um governo verdadeiramente antiindígena: o que menos demarcou terras indígenas e o que mais avançou na restrição ou supressão dos direitos dos povos indígenas do Brasil.

Se seu governo é de fato diferente senhora Presidenta demonstre isso atendendo as reivindicações abaixo, a maioria das quais foi objeto de discussão entre a vossa excelência e representantes dos nossos povos no dia 10 de julho do corrente.

1. Incidência efetiva do seu governo junto ao Congresso Nacional para o arquivamento das Propostas de Emendas à Constituição (PEC) 038 e 215 que pretendem transferir para o Senado e Congresso Nacional respectivamente a competência de demarcar as terras indígenas, usurpando uma prerrogativa constitucional do Poder Executivo.

2. Adotar o mesmo procedimento para a PEC 237/13 que visa legalizar o arrendamento das nossas terras, do PL 1610|96 de Mineração em Terras Indígenas, do PL 227/12.

3. Fortalecer e dar todas as condições necessárias para que a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) cumpra devidamente o seu papel na Demarcação, proteção e vigilância de todas as terras indígenas.

4. É fundamental para isso, inviabilizar a publicação da Minuta de Portaria proposta pelo Ministro da Justiça José Cardozo contra o marco legal vigente, o Decreto 1775/96, que já estabelece o procedimento de demarcação das terras indígenas.

5. Ao contrário, queremos que seu governo agilize metas concretas de demarcação para colocar fim ao sofrimento de muitos povos indígenas expulsos de suas terras tradicionais principalmente nas regiões do sul, nordeste e de Mato Grosso do Sul.

6. Exigimos a revogação de todas as Portarias e Decretos que ameaçam os nossos direitos originários e a integridade dos nossos territórios, a vida e cultura dos nossos povos e comunidades:
- Portaria 303, de 17 de julho de 2012, iniciativa do poder Executivo, por meio da Advocacia Geral da União (AGU) que estende equivocadamente a aplicação para todas as terras a aplicabilidade das condicionantes estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do caso Raposa Serra do Sol (Petição 3.388/RR).
- Portaria Interministerial 419 de 28 de outubro de 2011, que restringe o prazo para que órgãos e entidades da administração pública agilizem os licenciamentos ambientais de empreendimentos de infra-estrutura que atingem terras indígenas.
- Decreto nº 7.957, de 13 de março de 2013. Cria o Gabinete Permanente de Gestão Integrada para a Proteção do Meio Ambiente, regulamenta a atuação das Forças Armadas na proteção ambiental e altera o Decreto nº 5.289, de 29 de novembro de 2004. Com esse decreto, “de caráter preventivo ou repressivo”, foi criada a Companhia de Operações Ambientais da Força Nacional de Segurança Pública, tendo como uma de suas atribuições “prestar auxílio à realização de levantamentos e laudos técnicos sobre impactos ambientais negativos”. Na prática isso significa a criação de instrumento estatal para repressão militarizada de toda e qualquer ação de povos indígenas, comunidades, organizações e movimentos sociais que decidam se posicionar contra empreendimentos que impactem seus territórios.

7. Reivindicamos também do seu Governo políticas públicas específicas, efetivas e de qualidade,  nas áreas da saúde, da educação e da sustentabilidade, entre outros.

8. Aguardamos ainda com grande expectativa que seu governo crie por meio de Decreto o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e se comprometa com a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas no Congresso Nacional.

Pela defesa dos nossos territórios e da Mãe Natureza.
Mobilização Indígena Nacional

Brasília-DF, 04 de dezembro de 2013.

Em manifestação, índios tentam subir rampa do Palácio do Planalto

Índios de várias etnias, protestam em frente ao Palácio do Planalto. Os manifestantes entraram em confronto com seguranças ao tentarem subir a rampa que dá acesso ao local. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
 
Índios de várias etnias, protestam em frente ao Palácio do Planalto. Os manifestantes entraram em confronto com seguranças ao tentarem subir a rampa que dá acesso ao local. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
Um grupo de manifestantes indígenas entrou em confronto com seguranças do Palácio do Planalto na manhã desta quarta-feira (4/12). Eles tentaram subir a rampa que dá acesso ao local. Após a confusão, o grupo se deslocou para o Ministério da Justiça.

Os índios se concentraram no Centro Internacional de Convenções do Brasil (CICB), próximo à Ponte JK e seguiram até o palácio. A Polícia Militar foi acionada para acompanhar o protesto.
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil
 
Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

De acordo com a PM, o grupo participa da 5ª Conferência Nacional de Saúde Indígena, realizada no CICB. O encontro discute diretrizes para as políticas de saúde executadas nas aldeias.
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Ministro exonera coordenador de Distrito Sanitário Indígena em MS

Ministro da Saúde exonera coordenador do DSEI em MS (Foto: Fabiano Arruda/G1 MS)

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, exonerou, nesta quarta-feira (4), Nelson Carmelo Olazar do cargo de coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) de Mato Grosso do Sul. A portaria, de número 2.938, foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) e cita que a exoneração ocorreu “a pedido” do servidor.

A saída de Olazar do órgão, ligado à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), ocorre depois de índios ocuparem a sede do DSEI em Campo Grande, no dia 18 de setembro, e pedirem que o coordenador deixasse o cargo. Os indígenas permaneceram no local em forma de protesto e no dia 3 de outubro a Polícia Federal (PF) negociou a desocupação do prédio.
 
À época, servidores do órgão foram impedidos de trabalhar. O argumento dos índios para pedir a troca de comando era a má qualidade da saúde nas aldeias.

A situação também ganhou capítulo na Comissão Parlamentar de Inquérito da Saúde (CPI) da Assembleia Legislativa no dia 3 de outubro, quando Nelson Olazar e o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena em Mato Grosso do Sul, Fernando de Souza Terena, foram ouvidos pelos deputados e falaram do tema.

O DSEI, órgão ligado diretamente ao Ministério da Saúde, é responsável pela atenção básica e por intermediar, com a rede pública, hospitais e atendimentos de média e alta complexidade.
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quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Distritos indígenas receberão reforço do Mais Médicos na próxima semana

O secretário especial de Saúde Indígena, Antônio Alves de Souza, disse hoje (3) que 17 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) receberão o reforço, na próxima semana, de 49 profissionais do Programa Mais Médicos. Na 5ª Conferência Nacional de Saúde Indígena (CNSI), que acontece em Brasília, ele informou que cinco desses distritos estão na Região Nordeste.
“Com esses novos médicos contabilizamos hoje o número de 125 profissionais em 28 DSEIs. O programa beneficiará aproximadamente 212 mil indígenas. Atualmente, os indígenas são assistidos por 264 médicos distribuídos nas 34 DSEIs”, informou o secretário.
Ele acrescentou que a secretaria conta com 34 distritos, 354 polos bases, 68 casas de saúde indígena (Casai) e 751 postos de saúde. Antônio Alves ressaltou que as Casais funcionam como um estabelecimento de cuidados de enfermagem, de apoio aos pacientes encaminhados à rede do Sistema Único de Saúde (SUS). “A casa fornece alojamento e alimentação para os pacientes e acompanhantes e é a responsável por marcar e acompanhar os indígenas em consultas, exames ou internação hospitalar”.
O secretário destacou que melhorar as condições de trabalho sem garantir o acesso das equipes às aldeias de nada adianta. Segundo ele, as equipes de saúde têm dificuldades para chegar nas aldeias, o que pode demorar horas para se locomoverem. “Com isso, passamos a investir na aquisição de barcos, motores de popa, contratação de horas voo e reestruturamos a nossa frota de veículos naqueles distritos onde a maioria dos deslocamentos é feita por via terrestre”.
Outro problema que compromete o atendimento de profissionais de saúde aos indígenas é de aspecto cultural. O secretário frisou que, em algumas culturas, as crianças são as últimas a receberam comida na hora das refeições. “[Elas só comem] depois das visitas, dos guerreiros, dos anciões e das mulheres”. O Ministério da Saúde tem feito um trabalho para conscientizar essas aldeias onde as crianças e as mulheres gestantes estão mais fragilizadas. Nos locais, acrescentou, é necessário a implementação de políticas de diminuição da mortalidade infantil, ainda alta.
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terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Congresso terá palavra final sobre demarcações, conclui relatório da Subcomissão do Índio

O Congresso Nacional terá a palavra final nos processos para a demarcação de terras indígenas. Esta é a principal sugestão do relatório da Subcomissão Especial presidida pelo deputado Nilson Leitão (PSDB-MT) e que encerra seus trabalhos nesta semana com a aprovação do texto final.

O relator, deputado Asdrubal Bentes (PMDB-PA) sugere duas correções no processo de demarcação. A primeira fase da demarcação continuaria a cargo da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e do Ministério da Justiça, órgão ao qual se subordina.

 Na segunda fase, a demarcação passaria pelo crivo do Congresso Nacional, que a legitimará por meio da aprovação de projeto de lei, de iniciativa do Presidente da República.

A subcomissão defende também a instalação da Comissão Especial da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 215) que transfere do Executivo para o Legislativo a palavra final sobre a criação e ampliação de novos territórios.

Na avaliação do relator, a única política pública do governo federal em prol as comunidades indígenas é a demarcação de terras.

“A principal ação do Governo em prol das comunidades indígenas resume-se na demarcação das terras indígenas, ficando em segundo plano as ações de atenção à saúde indígena e à educação”, concluiu Bentes.

De acordo com o relator, fica evidente a parcialidade do governo e demais agentes públicos responsáveis ao fazerem prevalecer uma interpretação extensiva do conceito de terras indígenas.

Ainda segundo ele, nas reuniões de trabalho, nas missões oficiais, e nas audiências públicas, os membros da Subcomissão puderam constatar que os critérios e a metodologia adotada na aferição dos limites de determinada terra indígena não se ampara em critérios significativamente técnicos.

“Usam como provas depoimentos sobre a história pregressa narrada por ascendentes e ancestrais. As consequências têm se mostrado perversas. Posses e propriedades rurais, áreas produtivas, áreas urbanas, unidades de conservação da natureza e outras destinadas a legítimos fins e objetivos são sumariamente extintas pelo vigente sistema”, argumenta o relator.

Leitão terá reunião esta semana com o relator para aprovação do texto final com as conclusões e sugestões.

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Cimi faz reflexão da morte de Ambrósio Kaiowá e conflitos no MS

Morreu aos 52 anos a liderança Aty Guasu, Ambrósio Vilhalva, Guarani Kaiowá, do acampamento Guyraroká, no Mato Grosso do Sul. Abaixo, uma nota do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) que faz algumas reflexões acerca de sua morte. "Expor grosseiramente os fatos relacionados à morte de Ambrósio apenas fragiliza a imagem dos indígenas e reforça os estereótipos que a hegemonia da elite agrária sul-mato-grossense insiste em vincular aos povos Guarani", diz um trecho.

Na página do Facebook Aty Guasu, a liderança é definida como: "Líder Ambrosio é um líder justiceiro, íntegro, humilde humorista indígena Kaiowá e sorridente, defensor de direitos humanos, boa liderança e é conhecido internacionalmente como filósofo e intelectual nativo". Abaixo, a íntegra da nota do Cimi.

A morte de Ambrósio Kaiowá

Ambrósio Vilhalva, liderança Guarani Kaiowá do acampamento Guyraroká, morreu. Foi assassinado a facadas às oito e meia da noite do domingo, 1, em sua própria aldeia, a caminho de casa.

Sua morte é triste e complexa. Propomos aqui três apontamentos para refletir e para tentar compreender a morte de Ambrósio - e seus últimos anos de vida.

O primeiro está relacionado à terra. Guyraroká é um território retomado pelos Kaiowá. Em 1990, um grupo de 30 famílias que viviam confinadas na reserva Tey'kue, em Caarapó, conseguiu ocupar 60 hectares de uma das fazendas. Dali foram expulsos e permaneceram por quatro anos na beira da estrada, até que conseguiram voltar para a área.

Estudos antropológicos confirmaram a tradicionalidade do Guyraroká: 12 mil hectares foram identificados como terras originariamente ocupadas por àquelas famílias. Em 2009, o Ministério da Justiça publicou uma portaria declaratória, reconhecendo a área como efetivamente indígena.

O segundo apontamento está relacionado aos impactos do processo histórico imposto aos Guarani Kaiowá de perda de território e do confinamento nas reservas. Estas experiências foram traumáticas, transformaram abruptamente seus modos de viver a vida. Diminuiram e alteraram profundamente a qualidade e o sentido da vida destas pessoas.

Nesse contexto, bem como o suicídio, o uso compulsivo de bebidas alcoólicas proliferou com bastante força, atingindo centenas de Kaiowá desde então. Para suportar as tentativas de disciplinamento por parte do Estado e do capital, embriagar-se ou se matar forjaram-se como saídas. E Ambrósio bebia muito.

O terceiro apontamento tenta dar cabo do elemento mais trágico e grotesco da história: Ambrósio, segundo informaçãoes preliminares, teria sido assassinado por indígenas - e não por pistoleiros. No último período, a liderança vinha sendo alertada pela comunidade sobre os problemas que o uso compulsivo de bebidas alcoólicas traziam. Ambrósio vinha se tornando cada vez mais hostil com os indígenas da aldeia.

As memórias dão conta de que antes ele não era assim. Ambrósio era um bom yvyra'ja (aprendiz e auxiliar) do pai, seu Papito, tekoa’ruvixa (ou ñanderu, o rezador tradicional Kaiowá) da comunidade. Em 2008, Ambrósio foi um dos protagonistas do longa de ficção Terra Vermelha, co-produção italiana e brasileira sobre a tragédia Kaiowá. Bastante elogiado, o filme teve cinco nominações (entre elas, para o Festival de Veneza) e duas premiações. Ambrósio viajou bastante em função das agendas extensas de divulgação do filme (busque "Ambrósio Vilhalva" no Google para ter uma ideia).

Depois da exposição e da circulação do Kaiowá em festivais, espaços políticos e outras esferas, em diversos países, ele teria ficado assim, avesso, conforme indígenas que conviveram com Vilhalva. Sob severas privações em seu tekoha diminuto, a circulação de Ambrósio pelas extensas arenas por onde Terra Vermelha o levou teria acentuado as dissociações causadas pela invasão das terras Guarani Kaiowá, alçando Vilhalva a uma imagem difusa de si próprio.

Outros atores do filme também têm sofrido problemas semelhantes. Os produtores de Terra Vermelha possivelmente desconhecem esse fato, e muito menos anteviram os efeitos que a velocidade estonteante com que Ambrósio foi solapado provisoriamente de seu universo social causariam.

Expor grosseiramente os fatos relacionados à morte de Ambrósio apenas fragiliza a imagem dos indígenas e reforça os estereótipos que a hegemonia da elite agrária sul-mato-grossense insiste em vincular aos povos Guarani, com o intuito de reduzir as razões e a justeza que os levam a reivindicar seus territórios tradicionais. É preciso ser mais complexo e justo com a história, porque é exatamente o contrário disso.

Fonte: Cimi

Queiram gentilmente concordar com seu próprio extermínio, diz MJ

A irresponsabilidade e o cinismo do Governo Federal em relação aos povos indígenas atingiu um patamar inimaginável, com a divulgação nos últimos dias de uma minuta de portaria para “regulamentação” do Decreto 1775/1996, dispositivo que rege o já complicado e lento processo administrativo de regularização de terras indígenas no país.

Não é novidade para ninguém o cenário de calamidade em que se encontram as comunidades indígenas que ainda não tiveram suas terras demarcadas, especialmente em Estados como o Mato Grosso do Sul, o Paraná e o Rio Grande do Sul. Os índices de assassinatos, suicídios, violência de todo tipo, sem falar na falta de acesso a direitos sociais elementares de cidadania, iniciando pelo simples registro civil dos indígenas, são de não fazer inveja para os episódios mais sombrios da história humana e exigiria um esforço sincero do Governo para a reversão deste quadro.

Depois de um banho-maria de meses, nos quais ficaram paralisados todos os processos de demarcação de terras sob pretexto de fazer avançar um novo marco regulatório que traria ao Governo o mágico poder de “mediar” conflitos históricos sem tomar posição, eis que o Ministério da Justiça traz à tona esta portaria desastrosa, que terminará por inviabilizar os processos de demarcação justamente nessas regiões onde o conflito é latente, estrutural, e tão arraigado historicamente que certamente ainda trará grande dor de cabeça para este Governo que prefere tapar o sol com a peneira, e seguir fazendo valer suas alianças de governabilidade acima de qualquer bom senso em relação à realidade.

A medida é irresponsável porque metade da população indígena do país que se encontra fora da Amazônia segue existindo, com taxas de crescimento demográfico altas, e confinadas em espaços diminutos de terra, depois de passarem por processos violentíssimos de expropriação sobretudo no século XX. É o caso dos 40 mil guaranis e kaiowas que habitam o Mato Grosso do Sul, e também dos guaranis das regiões Sul e Sudeste, e dos povos do nordeste. Eles continuarão aí, lutando por suas terras e pelo futuro de seus filhos e netos, com a mesma força e persistência que vêm demonstrando ao longo dos quinhentos anos de invasão. Lula disse, em visita recente na qual costurava apoio dos ruralistas no Mato Grosso do Sul para a reeleição da presidenta Dilma, que ela deveria tomar imediatamente para sua mão a “saída para os conflitos” para que tivesse efeito em "tempos de paz", porque "na hora que começar a guerra vai ser muito mais difícil, muito mais caro e muito mais complicado". Se os tempos já não são de paz, como finge crer o ex-presidente, a completa paralisação dos processos de demarcação certamente levará a uma guerra cada vez mais intensa.

O problema é que o Governo tem deixado claro a quem prestará apoio durante esta guerra. Enquanto fazendeiros são acusados frequentemente de encomendar assassinatos de lideranças indígenas, especialmente no MS, e o Governo nada faz para apurar, conter a violência ou proteger os indígenas, as retomadas de terras, que restam como o último recurso dos índios diante de um cenário como esse, são cada vez mais criminalizadas. Neste mesmo mês, o MJ já lançou uma outra portaria neste sentido, na qual envia tropas da Força Nacional para o MS numa clara tentativa de inibir a luta dos Guarani, Kaiowa e Terena. Nas agora chamadas “Câmaras de Mediação” que o MJ tem criado para “mediar conflitos”, o Ministro Cardozo nada mais faz do que chantagear os índios dizendo que não fará avançar os processos das terras nas quais eles façam retomadas. Se não fazem retomadas, ele não faz nada para avançar porque teria que ouvir a deus e o mundo antes de tomar qualquer decisão; se fazem, ele não faz nada porque arrumou um pretexto para isso.

Mas além de irresponsável a recém divulgada “portaria regulatória” do MJ, que teve grande contribuição da AGU e da Casa Civil, é trazida a público com o gesto de maior cinismo que poderíamos imaginar.Depois de meses de discussão a portas fechadas, o MJ divulga a portaria já pronta apresentando-a à Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), sob pretexto de consulta. Simultaneamente, apresenta-a ao Congresso dos Ruralistas, que não perderão a oportunidade para tentar deixar a tal portaria ainda pior e enterrar de vez qualquer tentativa de solução para o conflito que não seja a eterna submissão dos índios a uma situação de desgraça, a caminho de mais um ciclo de genocídio. Além de se submeter ao genocídio, restaria ainda aos índios representados pela sua bancada na CNPI ter de referendar o processo, para que o Governo não precisasse sentir-se sozinho como o grande responsável por esse ato desastroso.Mas as lideranças indígenas da CNPI e de todo Brasil certamente não cederão a esse capricho cínico, e expressarão toda a sua revolta dando a responsabilidade a quem merece, como já sinalizaram através de nota da APIB.

Mais uma vez será necessário um grande esforço da sociedade e do movimento indígena para conter essa medida, já que o Governo Dilma insiste com todos os meios de que tem, em ser registrado na História como o grande algoz dos indígenas durante o período “democrático”. O que não é de se admirar se consideramos que as analogias entre a política da Ditadura Militar e a do Governo Dilma são muitas e se expressam em vários campos, a ponto de nos perguntarmos se não estaríamos diante de um caso político da Síndrome de Estocolmo. A portaria proposta pelo MJ agora é a reedição exata do modelo de demarcação de terras indígenas que vigorava durante o regime de exceção, no qual as decisões de caráter técnico eram submetidas aos acordos políticos do chamado “grupão”, como já se notou desde que seu embrião foi anunciado pela Ministra Gleisi. Um enorme retrocesso, em suma. Para não falar da adoção de um modelo econômico baseado no crescimento a qualquer custo e na primarização centrada na exportação de commodities, outra marca da Ditadura, o Governo Dilma repete condutas ainda mais graves e surpreendentes, como a edição de leis de exceção (como a Lei Geral da Copa e a Lei Antiterrorismo) para fazer passar a Copa do Mundo em um país que desde de junho tem provado não ser este mar de submissão que os analistas pintavam. Se aos índios só resta mais uma vez a mobilização de base, a sociedade toda deve ficar alerta para que o Governo não procure a “saída para os conflitos”, de que falava o ex-presidente, na criminalização da resistência indígena, como cada vez mais parece querer fazer ser o caso.
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segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Força Nacional permanece por mais 90 dias no MS

A Força Nacional de Segurança Pública continuará por mais 90 dias no estado do Mato Grosso do Sul, onde realiza ações de prevenção e repressão a conflitos agrários e na atuação em casos que envolvam comunidades indígenas. A decisão do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, foi publicada nesta sexta-feira (29), no Diário Oficial da União.

A decisão do ministro da Justiça levou em consideração o acordo de cooperação federativa da Força Nacional, celebrado entre a União e o estado do Mato Grosso do Sul, considerando a manifestação do diretor da FN, tenente-coronel Alexandre Aragon.

Em reservas indígenas como Dourados (MS), a Força Nacional presta apoio à Polícia Federal desde junho de 2011, quando foi desencadeada a Operação Tekohá (Nossa Terra) para fiscalização nas aldeias Jaguapiru e Bororó. O objetivo é diminuir os índices de violência contra a comunidade indígena.

Além de atuar na prevenção a conflitos agrários e indígenas, os componentes da Força Nacional atua também no combate ao tráfico de armas e drogas, descaminho, contrabando e outros crimes mais comuns em áreas de fronteira.

A renovação conta da data da publicação da portaria e pode ser prorrogada, levando em consideração o pedido do estado do MS e a análise do Ministério da Justiça.

Apenas nos últimos sete dias, a Força Nacional no Mato Grosso do Sul prendeu oito bolivianos por portarem documentação falsa, mais dois homens com mandados de prisão em aberto por assaltos, realizou uma prisão em flagrante por lesão corporal grave e apreendeu cocaína e maconha.

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Governo coloca em debate minuta sobre demarcações indígenas

O Ministério da Justiça colocou em debate nesta semana a minuta da portaria que altera das regras para demarcação de terras indígenas. A proposta foi encaminhada aos diversos setores envolvidos na discussão do tema e pode ser modificada até a publicação no Diário Oficial da
União (DOU).

O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado federal Luiz Carlos Heinze (PP/RS) afirmou que ainda não tem uma opinião formada sobre a proposta que está sendo analisada pela assessoria jurídica da bancada ruralista como das diversas entidades do setor agropecuário.

"Na próxima segunda-feira (02/12) realizaremos uma reunião para debater o assunto”, disse ele. Já o presidente da Comissão de Integração Nacional, Desenvolvimento Regional e da Amazônia (Cindra), deputado federal Jerônimo Goergen, (PP-RS), elogiou o gesto político do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT/SP).

"Temos aqui que registrar o diálogo ocorrido. Nós criamos essa proposta do Grupo de Trabalho, o prazo para que essa proposta acontecesse demorou um pouco. Mas o ministro, antes de publicar, trouxe para que nós pudéssemos fazer uma análise e uma contraproposta”, disse ele.

O deputado lembrou que a mudança na sistemática das demarcações de terras indígenas vem sendo discutida desde maio deste ano, quando a ministra-chefe da Casa Civil Gleisi Hoffman anunciou alterações no processo durante audiência pública sobre o tema, realizada na Câmara dos Deputados.

Jerônimo afirmou que numa rápida análise é possível identificar pontos favoráveis e contrários ao direito de propriedade na proposta apresentada pelo governo. Jerônimo destaca que a proposta torna o processo mais transparente e possibilita maior participação dos entes federados, além de propor a criação de uma câmara de conciliação para tentar reduzir os litígios.

Como ponto negativo, ele cita o fato de a Fundação Nacional do Índio (Funai) continuar com as prerrogativas de enviar processos para a câmara de conciliação. Na opinião do deputado, "a Funai ainda tem o papel principal da execução, do julgamento e da realização do laudo antropológico".

A proposta de portaria entregue às entidades, parlamentares e órgãos públicos prevê que vários ministérios poderão indicar representantes para compor o grupo técnico que irá analisar os processos de demarcação, além de Estados e municípios onde se localiza a área do estudo.

Jerônimo acredita que os prazos para a discussão são muito curtos. “Não tem nenhuma condição de que a contribuição possa ser aprofundada. Vamos com certeza mexer nessa questão, mas principalmente uma maior participação dos agricultores no processo em si”, explicou o parlamentar.

O deputado disse que também está previsto um encontro na próxima semana com o ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Luis Inácio Adams, para analisar a entrada em vigor da Portaria 303/2012, que havia sido suspensa até a conclusão do julgamento do caso Raposa Serra do Sol.

Ele lembra que a Portaria 303 coloca em prática as 19 condicionantes impostas pelo STF para a demarcação da reserva em área contínua, em 2009. Essas condicionantes seriam extensivas aos demais processos de demarcação de terras indígenas, inclusive aos já finalizados.
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Índios estão em pé de guerra

Índios estão em pé de guerra
Rejeição total. É o objetivo do movimento que será organizado nesta semana pelos líderes dos povos indígenas do Brasil contra minuta de portaria enviada pelo Ministério da Justiça enviou ao Congresso Nacional sobre novos procedimentos de demarcação de terras indígenas.
“O governo fez a minuta para atender os interesses dos ruralistas”, afirmou ao DCI Kleber Busatto, secretário do Conselho Missionário Indigenista (Cimi), organismo vinculado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) que conferiu um novo sentido ao trabalho da Igreja Católica junto aos índios.
A minuta de portaria reduz os poderes da Fundação Nacional do Índio (Funai) na demarcação. Hoje o órgão conduz todo o processo de análise das futuras áreas. Pela proposta, a Funai, que é subordinada ao ministério, terá de seguir critérios e responder questionamentos feitos por prefeituras, governos estaduais, comunidades tradicionais e órgãos federais ligados às áreas de agronegócio, energia, transporte e meio ambiente. 
“Esse é um instrumento para inviabilizar a demarcação de novas terras indígenas”, apontou o executivo do Cimi.
Mudanças positivas
A minuta foi entregue ao presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) na quinta-feira (28). Segundo o presidente da Comissão da Amazônia, o ruralista Jerônimo Göergen (PP-RS), a bancada pretende mandar uma contraproposta ao Ministério da Justiça no final da semana que vem. Ele avaliou como positivas as mudanças sugeridas pelo Executivo. Mas quer ampliar o debate sobre o assunto com outros representantes do agronegócio no Congresso. Uma de suas propostas é permitir que terceiros acionem a Câmara de Mediação de Conflitos diretamente. 
Infidelidade pode cassar 13 deputados 
A Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a cassação do mandato de 13 deputados federais por infidelidade partidária. Autor das ações, o vice-procurador-geral eleitoral, Eugênio de Aragão, afirma que os pedidos decorrem do caráter representativo do mandato, como expressão da vontade popular.
Segundo o vice-procurador, os 13 parlamentares que responderão por infidelidade partidária não comprovaram o cumprimento de nenhuma das hipóteses legais que autorizam o procedimento de desfiliação. Conforme os pedidos de cassação, esses deputados escolheram como novos partidos legendas já existentes, sem apresentar uma justa causa para a troca. Boa parte das trocas de partido ocorreu entre setembro e outubro, em meio a filiações aos recém-criados Solidariedade (SDD) e Partido Republicano da Ordem Social (PROS).
PEC aumenta cota tributária dos municípios 
A Câmara dos Deputados analisa uma proposta de emenda à Constituição (PEC), elaborada pela Comissão de Legislação Participativa a partir de sugestão (SUG 85/13) apresentada pela Federação Catarinense de Municípios, que destina aos municípios brasileiros 10% da arrecadação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e das contribuições sociais sobre o faturamento ou receita (Cofins) e sobre o lucro (CSLL).
Aposentadoria especial para deficientes será regulamentada 
O senador Gim (PTB-DF) informou que no próximo dia 3 de dezembro a presidente Dilma Rousseff vai assinar o decreto que regulamenta a Lei Complementar 142/12, que garante aposentadoria especial para pessoas com deficiência. Segundo o parlamentar, 17 milhões de brasileiros que têm algum tipo de deficiência vão ser beneficiados.
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quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Brasília sedia '8ª Mostra de Cinema e Direitos Humanos na América do Sul'

Brasília recebe entre 11 e 15 de dezembro a "8ª Mostra de Cinema e Direitos Humanos na América do Sul: Poética e Cidadania sobre Película", em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). A abertura da mostra está marcada para o próximo dia 3.
Ao todo, 38 filmes serão exibidos em todo o território nacional. As exibições serão divididas em três categorias: mostra competitiva de longas, médias e curtas; mostra homenagem – Vladimir Carvalho; e mostra cinema indígena.
Os filmes serão exibidos em formato digital  nas 27 capitais brasileiras e em cidades do interior. São mais de 600 pontos extras de exibição, entre cineclubes, pontos de cultura, institutos federais de educação profissional, científica e tecnológica, universidades, museus, bibliotecas, sindicatos, associações de bairros, telecentros, entre outros. Em cada cidade, a programação se estende por seis dias, totalmente aberta ao público.

“Nossa proposta é utilizar a linguagem cinematográfica para estabelecer um diálogo direto com a população. A mostra tem o importante papel de disseminar e fortalecer a educação e a cultura em direitos humanos, especialmente de forma a alcançar os setores historicamente excluídos ou com menos acesso a bens culturais, tratando do enfrentamento a todas as formas de violações de direitos”, diz a ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário Nunes.

Durante o festival, os vídeos serão exibidos com closed caption, ou seja, terão legendas informando todos os sons que estão na cena, além das falas. Para as pessoas com deficiência visual, haverá um narrador que descreverá com detalhes o que está na tela e o que é indicado fora dela.
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Novas regras para demarcação de terras indígenas devem sair segunda-feira

O Ministério da Justiça deve divulgar na próxima semana as novas instruções para o processo de demarcação de terras indígenas. A minuta do documento será apresentada segunda-feira (2) a lideranças indígenas integrantes da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI).
O texto estabelece instruções para execução do procedimento administrativo de demarcação previsto no Decreto 1.775, de 8 de janeiro de 1996. Na avaliação do Ministério da Justiça, que desde abril vem falando sobre a possibilidade de mudança, as normas vão trazer mais transparência para o processo e minimizar os conflitos entre índios e ocupantes das áreas reivindicadas como territórios tradicionais indígenas.
Uma das principais alterações previstas é que o Ministro da Justiça poderá determinar a instauração de procedimento de mediação em qualquer fase do processo de demarcação das terras, em busca de soluções pacíficas para os conflitos. Outra proposta é que a Fundação Nacional do Índio (Funai) dê prioridade a processos de identificação e delimitação de terras indígenas onde existir situação de vulnerabilidade social dos índios.
Haverá também prioridade nos casos de inexistência de terra demarcada para a mesma comunidade ou etnia na região; quando houver previsão de empreendimento público de interesse da União na área reivindicada; estudo ou proposta do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de criação de projetos de assentamento ou de reconhecimento de território quilombola na área reivindicada; ou quando houver estudo ou proposta de órgãos ambientais para criação de unidade de conservação ambiental na área reivindicada.
 O texto também abre possibilidade de participação de membros da comunidade científica, de entidades civis e outros interessados no “acompanhamento do procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas, desde que não interfiram de modo a perturbar ou impedir o seu regular processamento”.
Para a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), tais alterações não vão contribuir para resolver os conflitos em torno dos processos de demarcação, pois podem facilitar a ação de fazendeiros, por meio de suas associações. “A mudança quer dar voz para aqueles que sempre se opõem ao reconhecimento das terras indígenas. Isso vai fazer com que os processos nunca cheguem a uma conclusão. Por isso, repudiamos essa portaria”, disse à Agência Brasil o coordenador da Apib, Lindomar Terena.
Além da possibilidade de participação de entidades civis, o texto traz para o processo de demarcação a participação de diferentes órgãos do governo federal, como os ministérios da Agricultura, das Cidades, de Minas e Energia e dos Transportes, e dos estados e municípios em que se localizem áreas em estudo para demarcação.
Para o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, a portaria cria mais obstáculos no processo, pois traz a possibilidade de participação de sujeitos diametralmente opostos à demarcação, criando uma celeuma no procedimento administrativo. "Em vez de resolver, vai perpetuar os conflitos”, afirmou.
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terça-feira, 26 de novembro de 2013

ONU: Violência contra as mulheres é inaceitável – sem importar como estão vestidas



A violência contra as mulheres continua como uma das mais grandes calamidades de nosso tempo. É escandaloso que, hoje em dia, para muitas mulheres e crianças a violência se encontre nas esquinas, locais de trabalho ou em suas próprias casas. E, frequentemente, a justiça está ausente.
Em Busia, Quênia, em junho deste ano, uma jovem de 16 anos de idade foi violentada e jogada em uma fossa de seis metros de profundidade, que acabou ocasionando em uma fratura da coluna e uma fístula obstétrica. A polícia decidiu não perseguir penalmente os homens. Em lugar, como castigo, ordenou-lhes cortar o gramado da estação policial.
A notícia desencadeou uma excepcional manifestação de indignação pública. A campanha “Justiça para Liz”, assinada por um 1,4 milhões de pessoas, fez com que o presidente da Corte do Quênia tomasse providencias imediatas para o caso. Por que foi necessária a mobilização de 1,4 milhões de pessoas para que se iniciasse o processo de justiça e qual é o direito humano fundamental da vítima?
Em outra parte do mundo, em Auckland, Nova Zelândia, quando uma menina de 13 anos de idade havia denunciado a polícia de que havia sido violentada por três jovens, uma das primeiras perguntas que ela contou que lhe fizeram foi: “Como estava vestida?”. Isto ocorreu em 2011. Dois anos mais tarde, depois de várias agressões similares pelo mesmo grupo, se gerou uma reação pública com o objetivo de que as autoridades tomassem alguma medida.
Ao órgão de controle da conduta da polícia da Nova Zelândia foi ordenado revisar a conduta destes casos e a polícia, agora, finalmente está realizando as investigações que deveriam ter sido iniciadas dois anos antes.
Tristemente, estes não são casos isolados. Estes crimes ocorrem regularmente em diversos países em todo o mundo, mas raramente aparecem nas manchetes, geram uma indignação pública ou levam as autoridades a tomar decisões.
Na maioria dos lugares, as mulheres são envergonhadas ou intimidades por denunciar à polícia a violência, particularmente a violência sexual. E quando elas ultrapassam as diversas barreiras sociais e tabus e fazem uma denúncia, enfrentam, frequentemente, cruéis e insensíveis reações oficiais, que, de maneira efetiva, impedem o acesso a justiça.
A violência contra as mulheres e crianças têm se perpetuado por séculos de dominação masculina e discriminação baseada no gênero. Esta violência está embasada em normas profundamente enraizadas socialmente, as quais só reconhecem o valor das mulheres a partir de noções discriminatórias de castidade e “honra” e é frequentemente usada para controlar e humilhar não apenas as vítimas, mas também suas famílias e comunidades.
É essencial desafiar estas noções, que comumente permeiam o sistema de justiça, o qual resulta em um círculo vicioso de impunidade e maior violência.
O Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher e a relatora especial sobre a Violência contra as Mulheres têm documentado a violência contra as mulheres, suas causas e consequências em todo o mundo e têm recomendado medidas para eliminar esta violência e reparar suas consequências.
Estas recomendações devem ser levadas a sério. Os Estados estão obrigados pelo direito internacional dos direitos humanos a assegurar que o sistema de justiça penal, em cada uma de suas etapas, se encontre livre de preconceitos de gênero, que inclui a investigação, perseguição, interrogatórios, proteção das vitimas e testemunhas, o pronunciamento das sentenças.
A insinuação de que as mulheres têm uma propensão a mentir e que seu testemunho deve ser corroborado ou tomado com cautela deve ser eliminada em todas as etapas dos processos judiciais, assim como a ideia de que as mulheres incitam a violência sexual por estar fora de casa à noite ou por vestir-se de uma maneira em particular.
No Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra a Mulher, façamos o que estiver ao alcance para eliminar os estereótipos prejudiciais de gênero que ajudam a perpetuar um clima de que a violência contra as mulheres é considerada aceitável ou “merecida”. A violência contra as mulheres é simples e absolutamente inaceitável – sem importar como estejam vestidas.
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segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Organizações pedem intervenção federal em MS para resolver conflitos em Terras Indígenas

Carta Aberta à Presidenta Dilma Rousseff sobre as ameaças e ataques de ruralistas contra povos indígenas: Intervenção federal no Mato Grosso do Sul já
À Presidenta Dilma Rousseff
Desde a morte de Oziel Terena, assassinado por forças policiais durante o cumprimento de uma reintegração de posse na terra indígena Buriti em maio deste ano, uma série de acontecimentos tem colocado em risco a segurança e a vida das comunidades indígenas do Mato Grosso do Sul. Em sua guerra particular contra os povos indígenas, fazendeiros tem se manifestado de forma cada vez mais agressiva no discurso e na ação contra estes povos.
Estimulado por declarações violentas e preconceituosas de fazendeiros e seus representantes no Mato Grosso do Sul, o conflito chega a um estado de recrudescimento que exige de nós, organizações indígenas e indigenistas, vir a público mais uma vez denunciar a situação urgente e gravíssima dos povos originários do estado, e exigir uma intervenção federal imediata no Mato Grosso do Sul, de modo a evitar mais uma tragédia anunciada no Brasil.
Em Campo Grande, durante a invasão da sede da Fundação Nacional do Índio por 150 produtores rurais, no dia 19 de novembro, uma fazendeira gritou, dirigindo-se a indígenas que estavam no local: "o dia 30 está chegando (...), e rogo uma praga a vocês: morram. Morram todos!". Foi aplaudida pelos manifestantes.
Dia 30 de novembro foi o prazo final estabelecido pelos produtores rurais do Mato Grosso do Sul para que o governo solucione os conflitos fundiários no estado. No entanto, prevendo que o Estado não consiga apresentar uma proposta que efetivamente dê cabo do problema - e que favoreça o segmento do agronegócio - os fazendeiros, através de suas associações, tem pública e repetidamente dado declarações como esta.
"O prazo para uma solução final é 30 de novembro. Depois disso, como já é tragédia anunciada, os fazendeiros irão partir para o confronto legítimo para defender seu direito de propriedade. E vai haver derramamento de sangue, infelizmente", declarou o vice-presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul), Jonatan Pereira Barbosa, na tribuna da Comissão de Reforma Agrária do Senado Federal, no dia primeiro de novembro, conforme publicado no sítio eletrônico da entidade (veja aqui).
O presidente da Acrissul, Francisco Maia, no último dia 8, em reunião com 50 produtores rurais do estado, disse: “A Constituição garante que é direito do cidadão defender seu patrimônio, sua vida. Guarda, segurança, custa dinheiro. Para entrarmos numa batalha precisamos de recurso. Imagine se precisamos da força de 300 homens, precisamos de recurso para mobilização” (saiba mais).
Em nova reunião, no dia 12 de novembro, o vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), Nilton Pickler, também veio à público corroborar a posição da Acrissul: “Estamos em uma terra sem lei, onde invadir propriedade não é mais crime, alguma reação precisa ser feita”, afirmou.
As entidades representativas dos produtores rurais do estado estão organizando, para o dia 7 de dezembro, em Campo Grande, um leilão de animais, commodities, máquinas e produtos doados pelos próprios pecuaristas do estado, para arrecadar recursos para ações contra os indígenas. Deram ao evento o nome de "Leilão da Resistência". Declararam, no último dia 19, que já receberam 500 cabeças de gado como doação, equivalentes a, no mínimo, 500 mil reais.
O documento final da Quarta Assembleia do Povo Terena, que contou com a participação de mais de 300 lideranças Indígenas de todo o estado, representando os mais de 70 mil indígenas que lá vivem, declarava: "a tragédia está anunciada em Mato Grosso do Sul (...). É pública e notória a ameaça concreta intentada contra os povos indígenas pelos ruralistas deste estado". Para os indígenas, está claro: os “leilões da resistência" anunciados pelos produtores rurais "tem por objetivo financiar milícias armadas".
Em carta, os indígenas criticaram o Estado pelo abandono das negociações, no sentido de encontrar saídas para a questão indígena. "O governo federal instalou (...) uma mesa de diálogo na tentativa de resolver a demarcação de nossos territórios. No entanto, após vários prazos estipulados pelo próprio ministro [da Justiça], não há nada de concreto a ser apresentado aos povos indígenas".
As comunidades Terena, Guarani-Kaiowá, Guarani Ñandeva, Kinikinau e Kadiwéu em luta pela garantia de seus territórios tradicionais, tem relatado e denunciado à Polícia Federal, à Funai e ao MPF um sem número de casos de ataques a tiros, invasões, intimidações e ameaças de morte que os indígenas vem sofrendo no último período. Apesar disso, até o momento, nenhuma segurança permanente está sendo oferecida a estes povos.
Os indígenas conhecem bem o trabalho da segurança privada que os fazendeiros pretendem ampliar na região. Em contexto do conflito envolvendo indígenas e fazendeiros, em novembro de 2011, a empresa de segurança privada Gaspem, que prestava - e ainda presta - serviços a proprietários de terras que incidem sobre território tradicional indígena, foi acusada de envolvimento na morte do rezador Guarani-Kaiowá Nízio Gomes, no tekoha Guaiviry, em Aral Moreira. Na denúncia, o Ministério Público Federal do Mato Grosso do Sul (MPF-MS) classificou as atividades da empresa como de uma “milícia privada”, exigindo a suspensão das atividades da companhia. Em função do caso, sete pessoas estão presas, conforme relatou o MPF.
Jornais e televisões locais também tem associado o termo "milícias armadas" ao discurso dos ruralistas sobre o leilão e sobre as ameaças do dia 30 de novembro. Agências de notícias internacionais categorizaram o caso como "conflito sangrento (...) com características de guerra territorial".
É público e notória que, no Mato Grosso do Sul, os fazendeiros estão organizando força paramilitar para atentar contra a vida de coletividades e contra o Estado de direito no Brasil.
A "resistência" dos latifundiários é contra a demarcação das terras indígenas. É contra a realização de laudos e perícias pela Funai. É contra a organização política dos indígenas, que avançam na retomada de seus territórios tradicionais, frente à morosidade do Estado e da Justiça, de toda a violência que vem sofrendo, das mãos das forças policiais estaduais e federais, e das seguranças privadas “legais” ou ilegais que atuam na região. A dita "resistência" é, a rigor, contra a vida destas pessoas.
Em função desta conjuntura, extensão de um violento processo histórico de espoliação, confinamento e extermínio dos povos indígenas desta região, as organizações signatárias vem a público exigir da presidente Dilma uma intervenção federal imediata no Estado do Mato Grosso do Sul. O poder público pode e deve evitar esta “tragédia anunciada”, repetição sistemática do genocídio contra os povos indígenas. E isto precisa ser feito agora. O reconhecimento e a demarcação das terras indígenas é a verdadeira solução para a situação que está posta no Mato Grosso do Sul.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Ministro promete minuta de demarcação de terras para ruralistas e indígenas

O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) prometeu encaminhar uma minuta com as novas regras de demarcação de terras indígenas para lideranças de produtores rurais e dos índios para que eles possam contribuir com a elaboração da portaria que funcionará como um novo marco regulatório.
Ele não estabeleceu, contudo, prazo para encaminhar a proposta nem publicar a portaria. "Minha ideia é baixar a portaria com acordo ou sem acordo", disse hoje durante audiência no Senado.
Depois de recusar três convites para comparecer à Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, Cardozo foi convocado para falar aos senadores sobre os conflitos entre índios e produtores e a demarcação de terras indígenas. Também participa da audiência como convidado o ministro Luis Inácio Adams (Advocacia-Geral da União), que defendeu a necessidade de elaboração de uma lei completar para dar segurança jurídica aos processos de indenização e preservação de títulos de terra.
Cardozo, contudo, deixou claro que há disposição dentro do governo de esperar a palavra final do STF (Supremo Tribunal Federal) em relação à terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, antes de anunciar as novas regras para todo o país.
Apesar de ter mantido 19 condicionantes para a área em Roraima -mas que podem ser replicadas em outros locais pelo governo, o STF ainda analisa os chamados embargos declaratórios, para sanar eventuais omissões e obscuridades da decisão. Por avaliar que a decisão do Supremo é, no máximo uma jurisprudência, o governo diz ser preciso esperar sob o argumento de que ainda há insegurança jurídica.
Palhaço
Os ruralistas, contudo, têm pressa em resolver os conflitos espalhados por todo o país e cobram do governo uma posição definitiva. Nesta quinta, a senadora Katia Abreu (PMDB-TO) afirmou que a AGU (Advocacia-Geral da União) recuou por pressão de integrantes do governo favoráveis aos indígenas.
"Se vocês querem proteger um grupo de brasileiros, saibam que nós sabemos fazer pressão com muito mais força. Não estou ameaçando, mas segurando o pessoal. O produtor rural não vai pintar cara de palhaço não!", disse a senadora, que é presidente da CNA (Confederação Nacional da Agricultura).
Antes de deixar a comissão, a senadora provocou Cardozo: "O senhor não tem propriedade rural, né? Mora em apartamento". "Quando se tenta a conciliação haverá sempre a acusação de omissão", respondeu Cardozo. 
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quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Exposição de fotos traz retrospectiva de mais de 30 anos de lutas pelos direitos indígenas



Começou ontem 19/11, na Praça Externa do Museu da República, em Brasília, a exposição Povos Indígenas no Brasil 1980/2013 – Retrospectiva em Imagens da Luta dos Povos Indígenas no Brasil por seus Direitos Coletivos. A mostra comemora os 30 anos do Apoio Norueguês aos Povos Indígenas no Brasil e os 25 anos da Constituição. O projeto é uma realização da Embaixada da Noruega no Brasil e do ISA. No dia 19/11, acontece a abertura oficial, no mesmo local, com coquetel e show da cantora Elle Márjá Eira, do povo indígena Sami, do norte da Noruega. A abertura contará com a participação da embaixadora da Noruega no Brasil, Aud Marit Wiig, de Beto Ricardo, do Instituto Socvioambiental (ISA) e curador da exposição e da presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Maria Augusta Assirati. A exposição é composta por 43 fotos, apresentadas em ordem cronológica, clicadas por 33 fotógrafos, com mapas e textos de apoio, em português e inglês. A mostra é composta por 18 totens de 2,39 x 2 m, com imagens de ambos os lados. A iluminação noturna das peças será feita por coletores solares, no topo dos totens. Em 2014, a mostra estará em São Paulo, Rio de Janeiro, Manaus e Oslo (Noruega). Momentos e personagens históricos A maior parte das fotos foi publicada originalmente na imprensa ou nos volumes da série Povos Indígenas no Brasil, elaborada, inicialmente, pelo Centro Ecumênico de Documentação e Informação (Cedi) e, a partir de 1994, pelo ISA, com apoio do governo norueguês. A exposição traz momentos e personagens históricos, retratados num período de 33 anos no qual os povos indígenas saíram da invisibilidade para entrar de vez no imaginário e na agenda do Brasil contemporâneo. O marco desse processo foi o capítulo dos direitos indígenas da Constituição. Entre outros temas, as imagens retratam a participação indígena na Constituinte (1986-1988); a batalha pelo reconhecimento das Terras Indígenas; a resistência às invasões de garimpeiros e madeireiros; o apoio de músicos como Sting e Milton Nascimento; a apropriação das tecnologias do homem branco; as ameaças aos últimos povos “isolados”; as mobilizações recentes pela garantia de seus direitos. “Pretende-se que essas imagens sirvam de referência para as narrativas dos seus protagonistas, assim como para o aprendizado das novas gerações”, comenta Beto Ricardo. Em 1983, a Noruega criou uma linha específica de cooperação internacional para apoio aos povos indígenas e o Brasil foi o primeiro país a receber seus recursos. A Embaixada da Noruega apoia atualmente 15 associações indígenas e organizações indigenistas. A base da iniciativa é a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), um dos principais mecanismos internacionais de proteção aos direitos indígenas. A Noruega foi o primeiro país a ratificá-la, em 1990. O Brasil fez o mesmo em 2002. “A Noruega vem firmando parcerias de longa duração com várias associações indígenas e organizações não governamentais indigenistas no Brasil por meio de seu Apoio aos Povos Indígenas. O foco tem sido o apoio institucional”, informa a embaixadora da Noruega no Brasil, Aud Marit Wiig. "Extintos" A exposição trata de um período histórico recente (1980-2013) marcado pelo protagonismo político dos povos indígenas, depois de terem sido considerados extintos. Essa visão está presente no curioso relato do antropólogo Claude Lévi-Strauss, registrado em seu livro “Tristes Trópicos”, que serve de epígrafe à exposição. Em 1934, pouco antes de viajar ao Brasil, ele questionou o embaixador brasileiro na França sobre como encontrar comunidades indígenas. “Índios? Infelizmente, prezado cavalheiro, lá se vão anos que eles desapareceram”, respondeu o diplomata. O antropólogo Darcy Ribeiro registrou o decréscimo geral da população indígena e o desaparecimento de mais de 80 etnias, entre 1900 e 1950. Algumas fontes estimam que, em 1500, havia entre 2 milhões e 6 milhões de índios no que seria mais tarde o território brasileiro. A trajetória de resistência retratada na exposição, no entanto, coincidiu com a recuperação do crescimento demográfico dessas comunidades, registrada a partir dos anos 1980. Hoje, existem no Brasil 240 povos indígenas, que falam 154 línguas e somam uma população de mais de 896 mil pessoas (IBGE 2010). O número de índios continua crescendo, assim como o de etnias, embora alguns povos estejam ameaçados de extinção. Metade das etnias tem uma população de até mil pessoas; 49 têm parte de sua população habitando países vizinhos; há 60 registros de povos “isolados”.
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"Querem a cabeça dele como troféu"


Ruy Sposati, de Nioaque (MS)
Da Assembleia Terena
 

Entre os casos de ameaças e ataques relatados por lideranças durante a 4a. Assembleia Terena, o mais sério, hoje, é o da retomada da terra indígena Pillad Rebuá, no município de Miranda. Em Pillad, 2,2 mil indígenas vivem confinados em 94 hectares, divididos em duas aldeias: Moreira e Passarinho. O território teve o primeiro registro de reconhecimento pelo Estado em 1904. Um processo de demarcação teve início em 1950, mas não seguiu.

Em 9 de outubro, a comunidade da aldeia Moreira retomou uma das propriedades que incidem sobre o território reivindicado - a fazenda Trator Mil. Acampados no local desde então, os indígenas sofreram quase uma dezena de ataques a tiros e invasões atribuídos a fazendeiros da região.

Durante a assembleia, representantes da retomada relataram ameaças de morte que uma das lideranças da comunidade, Paulino Terena, tem sofrido. Em depoimento entregue por escrito ao Conselho, os indígenas relatam que "[fazendeiros] querem a cabeça dele como troféu".

Segundo o documento, um ex-empregado de uma fazenda que incide sobre o território reivindicado pagaria dinheiro a dois jovens indígenas "para passarem informação de tudo que está sendo articulado naquele lugar", e que estes jovens teriam levado um "recado" de fazendeiros para Paulino: "ele quer tirar a sua cabeça fora".

Os indígenas desconfiam que possa haver armamento ilegal, drogas ou dinheiro ilícito em algum lugar da fazenda, o que explicaria os ataques e ameaças. "Em uma dessas casas [dentro da fazenda], cogita-se que há existência de armas poderosas e de um cofre. Neste mesmo local há um depósito de óleo diesel clandestino", escreveram os Terena no depoimento. A casa não foi aberta e os indígenas convocam a Polícia Federal e o MPF a averiguarem o local.

Paulino confirma as ameaças, e afirma ter receio de ir ao perímetro urbano de Miranda. "Eles querem um pedaço de mim", expõe. "Já ouvi que querem cortar meu cabelo, cortar minha orelha. Eu ouvi de um proprietário de um supermercado local: 'se [a liderança] pisar dentro de Miranda, tem bala contada pra ele'. Já recebi duas vezes ligação no meu celular dizendo: 'Paulino, vai chegar o dia D'".

Trator incendiado

No último dia 12, fazendeiros expulsaram a tiros um grupo de famílias que havia retomado outra fazenda que também incide sobre a área reivindicada como terra
indígena Pillad Rebuá. Um trator pertencente à comunidade também foi incendiado pelos ruralistas, acusam os indígenas.

Uma liderança que estava próxima ao local do conflito expõe a tensão. "Eu ouvi o grito do fazendeiro, dizendo: 'vou colocar fogo nessa merda aqui!' Eu não sabia onde ele ia colocar fogo. Quando olhei, era a fumaça no trator", explica. "Eles também dispararam as armas. Eles atiraram na gente. A gente não quer confronto, então a gente recuou, a gente voltou [para a aldeia Passarinho]".