Ásia, África, Rússia e Ártico
estão muito distantes do Brasil, mas as dificuldades enfrentadas por
jovens indígenas desses lugares são muito próximas daquelas
vividas pelos jovens indígenas brasileiros.
É o que se pôde constatar na
“Reunião do Grupo de Especialistas em Juventude Indígena”,
realizada entre os dias 29 e 31 de janeiro na sede da Organização
das Nações Unidas (ONU) em Nova Iorque, um evento que faz parte do
Fórum Permanente sobre Questões Indígenas da ONU.
Essa Reunião conta com um número
limitado de especialistas e observadores, incluindo representantes de
organizações de povos indígenas e também ONGs que trabalham com o
tema, entre as quais a AJI (Ação dos Jovens Indígenas de
Dourados).
No dia 30, o tema era “Desafios”
na parte da manhã e “Esperanças” na parte da tarde. Pela manhã,
foram ouvidos dois jovens: Meenakshi Munda (Ásia) e Matuna R.
Niwamanya (África). A discussão girou em torno de temas sociais e
econômicos, tais como educação, emprego, exploração econômica,
saúde, direito à terra, condições sanitárias, residência,
discriminação, atividades de gangues, abuso de drogas, suicídio e
questões urbanas/migração.
Problemas complexos e diversos,
mas o que todos eles parecem ter em comum é a falta de envolvimento
dos governos com os problemas vividos por esses jovens. Além de uma
visível tentativa de silenciar as organizações, e mesmo as
lideranças indígenas, em relação aos jovens.
Uma questão que chamou a atenção
na fala desses jovens foi a urgência em se ter dados fidedignos em
relação aos povos indígenas, pois as estatísticas são sempre
aproximadas. Então, como tomar posições, propor políticas
públicas e exigir dos governos melhores condições se as
informações a respeito desses povos não são totalmente claras?
Essa é uma maneira de os Estados silenciarem os problemas
enfrentados pelos jovens indígenas.
Os jovens que fizeram suas
apresentações também abordaram o problema da violência gerado
pelas guerras civis na África; a falta de assistência médica
direcionada aos jovens, com pessoas treinadas para entender, e não
julgar, os problemas da juventude indígena; a necessidade de uma
educação verdadeiramente intercultural; a necessidade de
auto-organização desses jovens; falhas na legislação que se
refere aos jovens indígenas e a necessidade de um futuro para esses
jovens, baseado na terra.
“Como podemos falar de terra se
precisamos sair para estudar e trabalhar? Necessariamente somos
‘assimilados’ e a terra passa a ser menos importante. Os jovens
precisam voltar a olhar para a terra, pois é essa a nossa
oportunidade. Nós podemos ter tudo do ocidente, mas utilizando o que
eles oferecem em nossos territórios”, defendeu Tania P.Traqui,
representante da América Latina e Caribe.
Na parte da tarde, as
apresentações foram de Tuomas A. Juuso (Ártico) e de Igor Yando
(Europa do Leste, Federação Russa, Ásia Central e
Transcaucasiana). A discussão geral, mais uma vez, teve como
principal foco a falta de participação dos jovens em todos os
âmbitos da vida social, tanto dentro das comunidades como nos níveis
nacional e internacional.
Os principais problemas
elencados por Igor Yando foram: falta de emprego em consequência do
baixo nível educacional; falta de assistência do governo, que não
faz distinção étnica e não tem política específica para eles;
falha educacional (ausência de professores e, quando há, eles se
comportam como colonizadores), que resulta em altos índices de
desistência e muito poucos vão para a universidade; alcoolismo e
falta de perspectivas dos jovens. Além de que os jovens rechaçam
sua própria cultura e, ao mesmo tempo, não são incorporados pela
sociedade mais ampla.
Para o jovem Tuomas Aslak,
representante do Ártico, os jovens abandonam suas vidas tradicionais
e vão para os centros urbanos por vários motivos: a necessidade de
buscar melhor formação, a expulsão das terras pelas empresas
mineradoras, entre outros. E ele explica que não é fácil.
“Sofremos muito quando partimos, não somos aceitos, há uma grande
descriminação e sofremos muito com isso. O fato de partirmos, nos
faz deixar de vivenciar nossa cultura e, nesse sentido, perdemos o
nosso referencial. Penso que o alto nível de alcoolismo e suicídio
é o fato de haver esse mal-estar”, diz o jovem indígena
representante do Ártico.
Para qualquer pessoa que tenha
um mínimo de conhecimento sobre os problemas enfrentados pelos
jovens indígenas brasileiros, ficam claras as semelhanças entre as
dificuldades vividas no Brasil e nesses outros países e territórios
citados.
E agora, o que fazer?
Ao final do dia, os jovens
propuseram reflexões e medidas a serem implementadas:
-
O papel dos jovens dentro das comunidades é de ajudar os maios
velhos sobre o que acontece no mundo moderno, desempenhando o papel
de “ponte cultural”. Eles podem ajudar tornar mais claras as
informações em relação à conscientização sobre os direitos dos
povos indígenas, tecnologia, entre outros.
-
A vivificação da tradição e a manutenção da língua são os
fatores mais importantes, pois oferecem a esses jovens um lugar de
pertencimento.
-
O artigo 3 da UNDRIP sobre o consentimento livre, prévio e informado
precisa ser colocado em prática. Os jovens indígenas precisam e
devem exercer seus direitos de escolher que tipo de educação,
economia e justiça é melhor para o seu povo.
* Matéria
escrita a partir das informações fornecidas pela antropóloga Maria
de Lourdes Beldi Alcântara, que participou da reunião em Nova
Iorque como representante da IWGIA (Grupo Internacional de Trabalho
sobre Assuntos Indígenas).
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