
Nesta segunda-feira, 10, entidades e lideranças sociais denunciaram o governo brasileiro na 25ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas por violações de direitos indígenas no processo de construção de grandes hidrelétricas na Amazônia. As denúncias foram apresentadas pela coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Sônia Guajajara, e pelo advogado da organização internacional AIDA, Alexandre Sampaio, no evento “O direito das populações indígenas à consulta sobre grandes projetos hidrelétricos no Brasil”, organizado pela coalizão de ONGs internacionais France Libertes.
De
acordo com a coordenadora da Apib, a violação do direito dos povos
indígenas à consulta e o consentimento livre, prévio e informado,
previstos pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT) e não aplicada pelo Brasil, tem criado um perigoso precedente de
ilegalidades no tocante à observância dos tratados internacionais, e
está pondo em risco a sobrevivência da população indígena. “A aliança de
interesses econômicos e políticos aprofunda uma crise sem precedentes
na aplicação da legislação que protege nossos direitos. É inadmissível
que o governo viole direitos indígenas garantidos tanto pela
Constituição brasileira como por convenções internacionais”, afirmou
Sônia Guajajara.
Já
Alexandre Sampaio denunciou a utilização indiscriminada no país, por
pressão da Advocacia Geral da União (AGU) e do Ministério de Minas e
Energia (MME), do mecanismo da Suspensão de Segurança no caso de ações
na justiça contra violações das legislações ambiental e indígena
referentes a projetos hidrelétricos. Além de derrubar ações que visam
proteger as populações afetadas, sem julgamento de mérito e com
argumentos infundados sobre supostas ameaças à "ordem social e
econômica", as Suspensões de Segurança também reforçam a não observância
da Convenção 169 da OIT, afirmou Sampaio. “A Suspensão de Segurança tem
que ser abolida no Brasil. O problema é que os que a utilizam são os
mesmos que se beneficiam com ela. Por isso é importante que a comunidade
internacional fique ciente dessas manobras e cobre do governo
brasileiro medidas efetivas de garantia dos direitos humanos”, explica o
advogado.
Antes
da realização do evento sobre direitos indígenas no Brasil, vários
defensores dos direitos humanos se reuniram com a embaixadora da Missão
Permanente do Brasil na ONU, Regina Dunlop. Diante da afirmação da
embaixadora de que seria mais eficaz se as denúncias apresentadas fossem
discutidas com o governo brasileiro em Brasília, Sonia Guajajara e
Alexandre Sampaio afirmaram que as críticas aos grandes projetos são
sistematicamente ignoradas internamente até que sejam expostas em fóruns
internacionais, como os das Nações Unidas. “A reputação do Brasil está em jogo. Estamos
aqui para dar visibilidade ao preconceito e à discriminação
inaceitáveis sofridos pelos povos indígenas, e para por um fim a isso”,
afirmou a coordenadora da Apib.
Documentos
Além da realização do evento sobre direitos indígenas e barragens, uma coalizão de organizações internacionais com status consultivo na ONU (France Libertes/Fondation Danielle Mitterrand, The Women’s International League for Peace and Freedom, The Indian Council of South America (CISA), International Educational Development, Inc., Mouvement contre le racisme et pour l’amitié entre les peuples, Survival International Ltd,) e organizações brasileiras entregaram à Assembleia Geral das Nações Unidas dois documentos que destacam as ameaças dos planos do governo brasileiro de construir até 29 grandes barragens na bacia do Tapajós (incluindo os afluentes Teles Pires, Juruena e Jamanxim). As hidrelétricas previstas provocariam, em vários casos, a inundação de territórios indígenas e de comunidades ribeirinhas. Além disso, causaria outros danos irreparáveis à montante e à jusante das hidrelétricas, como a eliminação de espécies valiosas da ictiofauna (população de peixes) que constituem a base da economia e da sobrevivência da população local.
Da mesma forma que em Belo Monte,
o governo não tem realizado processos de consulta livre, prévia e
informada junto a povos indígenas e outras populações tradicionais
atingidos por grandes barragens na bacia do Tapajós, inclusive as usinas
Teles Pires e São Manoel já receberam licenças ambientais. Isso tem
provocado crescentes conflitos com comunidades locais, como os povos
indígenas Munduruku, Kayabi e Apiaka, que têm protestado contra a
violação de seus direitos.