Nós
os rezadores Guarani Kaiowá e Guarani Ñandeva, não nos chamamos mais
Ñanderu e Ñandesy. Nós reencontramos uma palavra antiga e agora somos de
novo Tekoa’ruvixa, aqueles que dão vida às crianças.
Nós
estamos preocupados em não ver acontecer o nosso sonho de ao menos
morrer em nosso tekoha terra tradicional. Queremos entrar na nossa terra
e morrer nela. Nosso sonho é esse e não dá mais pra esperar.
Nós
temos o nosso jeito de viver, de se organizar, de lidar com as coisas.
Cada reza é para uma coisa: para ter uma plantação, para ter saúde, para
não vir uma tempestade e destruir tudo. Temos rezas para eclipse do
sol. Nós Tekoa’ruvixa fervemos casca de cedro para beber e rezar, e
também para dar banho em crianças e jovens e curar.
Para
toda essa cultura continuar viva nós precisamos da terra. Essa cultura
funciona com a terra. Não temos como viver assim na beira de uma estrada
nem num canto de uma fazenda. Enquanto não tiver a terra, não tem como
viver.
Muitas pessoas brancas acham que o índio só quer terra. Mas a vida do índio depende da
terra. Por estarem sem tekoha há muito tempo, muitos jovens já crescem
sem saber o que é isso, tem um convívio traumatizado da vida. Então às
vezes os jovens não querem saber sobre os rezadores porque não sabem
mais o que é isso, porque estão longe da natureza, dos remédios, do
benzimento, das matas. O nosso espaço é que fornece isso.
Nós
sempre tivemos a nossa própria saúde. Mas sem a terra, a gente não tem
todos os recursos da natureza, que mantiveram nossa saúde por muito
tempo. Por não termos os recursos da natureza que a gente sempre teve,
nós precisamos dos recursos de saúde do governo. A gente tinha as
alimentações dentro das matas mesmo, mas por ela ter sido destruída, por
ter sido tirada da gente, precisamos de cestas-básicas.
A
terra é a sobrevivência da nossa cultura, da nossa nação. Essas são as
principais coisas. Isso não interessa para os brancos. Para os brancos
isso não é nada.
Uma
casa de reza não pode ser mudada de lugar. Os remédios tradicionais nós
só pegamos no tekoha. A gente tem a nossa própria educação tradicional
também, e para ela existir precisa de toda a cultura funcionando, para
os jovens indígenas continuarem a ser indígenas.
Os
Tekoa’ruvixa mais velhos estão envelhecendo e morrendo e queriam que já
tivessem voltado tudo no tekoha. Querem entrar na terra, ainda vivo,
para morrer no tekoha deles, onde morreram os nossos avôs. Não dá mais
para esperar.
Aty Guasu Ñanderu Mo Mbarete
27 de julho de 2013
Tekoha Jaguapiru, Dourados, Mato Grosso do Sul
Nós,
Tekoa’ruvixa, mulheres, lideranças, caciques, professores, agentes e
representantes da saúde e jovens Guarani e Kaiowá, com participação de
indígenas Terena e Kaingang, reunidos na Aty Guasu Ñanderu Mo Mbarete
entre os dias 23 e 28 de julho de 2013, no tekoha Jaguapiru, em
Dourados, Mato Grosso do Sul, reivindicamos:
- Cumprimento,
até o dia 5 de agosto, da promessa do governo federal de resolver o
problema da demarcação de todas as terras indígenas de todos os povos do
Mato Grosso do Sul. Nós estamos respeitando o acordo com o governo e
aguardando alguma solução, e até agora o governo não fez nada. Nós não
aceitaremos outro prazo. De norte a sul do país, nós indígenas estamos
juntos na luta contra a perda de direitos, contra a perda de nossas
terras, e pela demarcação de nossos territórios tradicionais. Nós não
estamos brincando.
- O
Conselho Aty Guasu referenda os seis instrumentos apresentados no
Conselho Nacional de Justiça que serão utilizados na superação dos
conflitos fundiários do Mato Grosso do Sul: conclusão definitiva das
demarcações de terras indígenas e indenização de benfeitorias para
possuidores de boa-fé; desapropriação de de áreas por interesse social;
aquisição direta de terras; assentamento de pequenos proprietários
rurais; transação judicial e indenização por ato ilícito do Estado,
decorrente da titulação considerada posterioremente ilegítima. Nós,
indígenas, não aceitaremos NENHUM acréscimo posterior no relatório.
- Exigimos
justiça nas dezenas de casos de assassinatos de lideranças, professores
e jovens indígenas no contexto dos conflitos e da falta de terra.
Nenhum dos assassinos dos Guarani e Kaiowá está preso e suas famílias
estão desasistidas. Exigimos punição aos culpados e respeito às
comunidades atacadas!
- Somos contra a paralisação das demarcações de terras indígenas.
- Os
fazendeiros cujas áreas incidem sobre território indígena precisam
parar de desmatar nossa terra, legal ou ileglamente. Exigimos que os
órgãos ambientais façam a fiscalização para coibir essas ações, e também
não emitam autorizações para desmatamento.
- Exigimos
que a Sesai garanta medicamentos, médicos, veículos, combustível e todo
o equipamento necessário para que o atendimento à saúde possa acontecer
nas aldeias e acampamentos Guarani e Kaiowá, e que todos os tekoha
tenham um agente de saúde indígena.
- Todas
as decisões dos governos sobre saúde, todos os recursos e projetos
voltados aos Guarani e Kaiowá devem passar pelo Aty Guasu, e também os
conselheiros indígenas devem ser consultados.
- Os
motoristas da saúde devem ser reconhecidos também como profissionais da
saúde, e tenham os mesmos direitos como trabalhadores. Os motoristas
são muito importantes na equipe da saúde - muitas vezes, são eles quem
fazem partos.
- Exigimos
que as prefeituras e secretarias de educação respeitem a organização
indígena escolar. A escola tem que funcionar como a comunidade quer, e
não como a secretaria de educação quer. Tanto a direção da escola quanto
os professores tem que ser indígenas. A maioria das escolas é dirigida
por brancos e isso traz muitos problemas, inclusive uma pressão para que
os professores não participem da luta pela terra. Isso tem que acabar.
- Queremos
que sejam criados núcleos de educação indígena ligados às secretarias
municipais de educação, para que os indígenas estejamos diretamente
envolvidos na gestão da política de educação do município.
- Exigimos que sejam garantidas escolas em todos os tekoha, inclusive os acampamentos, com sala, professores e merendeiras.
- Nós exigimos que secretaria estadual de educação faça a prestação de contas da verba destinada ao Ára Verá para o Aty Guasu.
- Queremos a ampliação dos cursos Ára Verá e Teko Arandu.
- Somos contra as mudanças no processo de demarcação das terras indígenas.
- Chega
de perseguição contra movimentos e entidades apoiadoras do movimento
indígena. Somos autônomos e independentes, e estabelecemos nossas
próprias relações políticas como bem entendermos e isso não é crime.
- Somos contra o PLP 227, a PEC 215 e a Portaria 303.
- Queremos
segurança em nossos tekoha. Com a falta de terra, sofremos os problemas
de estarmos confinados em pequenas terras e muitas vezes ameaçados e
atacados por pistoleiros, seguranças privados e fazendeiros. Chega de
perseguição da Polícia Militar, Civil e de parte da Polícia Federal.
- Repudiamos
a ação da Justiça Federal, Polícia Militar e Polícia Civil na condução
das investigações sobre o ataque sofrido pela comunidade Ita’y.
Encaminhamentos:
- O Aty Guasu elege Ladio Veron como representante do povo Guarani e Kaiowá no PNEGAT.
- O Aty Guasu indica Léia Aquino como representante do povo Guarani e Kaiowá no Consea
- O
Aty Guasu apresenta os cinco representantes do povo Guarani e Kaiowá na
Apib: Bento Hara, Jorge Gomes, Roseli Gonçalves Barbosa, Celso Alziro e
Fabio Turiba.
- O
Aty Guasu apóia a demanda do povo indígena sobre as a saída de
não-indígenas da coordenação da Sesai MS, e referenda as novas
indicações de indígenas para a coordenação da Sesai: professor Alberto
Terena e outro indígena ainda não escolhido9.
Aty Guasu Ñanderu Mo Mbarete
27 de julho de 2013
Tekoha Jaguapiru, Dourados, Mato Grosso do Sul
Aty Guasu Ñanderu Mo Mbarete: Carta dos jovens Guarani e Kaiowá
Nós,
jovens Guarani, Kaiowá, Terena, Kadiwéu e Kinikikau reunidos junto às
lideranças, rezadores Teko’aruvixa, professores, agentes e
representantes de saúde, em Dourados, na aldeia Jaguapiru, no Aty Guasu -
nós jovens estamos vendo o sofrimento na questão da luta de nosso
tekoha. Precisamos urgente que demarquem as nossas terras tradicionais.
Nós somos o futuro e a raiz da terra.
Queremos
nossas terras de volta. Estamos na luta pelo nosso direito. Passamos
precários problemas e obstáculos por causa das nossas terras. Nos
preocupa as nossas lideranças que já foram várias vezes ameaçadas, e
continuam sendo ameaçadas por estarem lutando pelo que é nosso.
Diante
dos problemas que passam todas as aldeias e acampamentos, que estão
sendo apresentados no Aty Guasu, estamos apoiando so nossos Tuvixa
porque são eles a nossa raiz.
Nos
comprometemos a valorizar nossa cultura, nossas rezas, dando
continuidade ao que nosso antepassado nos deixou. Essa é a nossa arma.
Pedimos que as autoridades resolvam logo o nosso problema, pela voz de todos os indígenas.
Exigimos uma educação diferenciado, que nossas escolas tenham professores indígenas, pois temos pessoas formadas pra isso.
Na
questão da saúde, sofremos diariamente a falta de medicamento,
viaturas, médicos e dentistas. A situação de saúde nos acampamentos é
precária. Falta agente de saúde e tudo mais.
Queremos concurso público diferenciado para indígenas, tanto na saúde quanto na educação.
Exigimos
mais segurança, com condições (viaturas e combustível), principalmente
em área de conflito, de retomada, opis nestes lugares sofremos ameaças
por parte de pistoleiro, e outros.
Garantir políticas públicas para a juventude indígena Guarani, Kaiowá, Terena, entre outros povos do MS.
Na esperança de sermos atendimentos, aguardamos.
Aty Guasu dos jovens
Dourados, 27 de julho de 2013
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