terça-feira, 30 de abril de 2013

Ollanta reitera que o espírito da lei consulta é dar voz apenas para comunidades indígenas


Peru - Servindi, 29 de abril, 2013.- 

Ollanta Humala, presidente de la República del Perú, afirmó anoche que el espíritu de la Ley de Consulta Previa es darle voz a las comunidades nativas que no tienen voz para hacerla llegar a las instancias de poder. Agregó enseguida que son pocas las comunidades que no pueden hacerlo.
“Hoy en día son pocas las comunidades que no tienen una autoridad como un alcalde o teniente alcalde y así en cadena llegar al gobierno regional o al presidente de la República. Más aún, con el avance de los medios de comunicación como para que suceda un abuso como los que había en el siglo diecinueve o veinte”, dijo.
“Aún así hemos dado la ley -dijo Ollanta- porque hay comunidades vulnerables pero el problema es definir quienes son comunidades nativas y cuáles no”.
“Con tanta informalidad que hay todo el mundo quiere ser consultado por que le puede dar cierto poder de negociación”, anotó el mandatario.
A pesar que la consulta no es vinculante y las autoridades del gobierno pueden decidir si vá la inversión o no. El gobierno asume la responsabilidad de coberturar esos factores que pueden ser afectados por la inversión; como el agua, el pasto para su ganado, etc. y asegurar la calidad de vida de las comunidades.
Sobre la base de datos sobre pueblos y comunidades indígenas indicó que no se puede publicar por ahora por que hay un litigio judicial pendiente de resolución.
Informó que actualmente hay un proceso de revisión de comunidades. “No se trata de publicar y que mañana tengamos medio Perú de comunidades” dijo.
Por ejemplo, indicó que en la costa no hay comunidades nativas por el proceso de migración a la costa. En la sierra la mayor parte son comunidades agrarias producto de la reforma agraria.
Señaló que la mayoría de comunidades nativas existen en la selva donde antes eran conocidas como “no contactadas”, pero hoy con la infraestructura y la modernidad estamos tratando de articular a todas las comunidades.
Las declaraciones se efectuaron la noche del domingo 28 de abril en una entrevista televisiva en el programa Punto Final que dirige Nicolás Lucar.

Particular punto de vista registra antecedentes

La particular visión del presidente de Perú sobre el derecho a la consulta previa no es nueva, y fue particularmente expuesta en una rueda de prensa concedida en Ginebra, Suiza, en junio de 2012.
En aquella ocasión afirmó que le Ley de Consulta beneficiaría a los pueblos no contactados y a las comunidades indígenas que no tienen una representación elegida democráticamente.
De esa manera, se excluiría -en su particular interpretación- a las poblaciones procedentes de las comunidades campesinas que constituyen la mayoría de la población indígena del país.
“La ley de consulta previa es para los pueblos originarios o comunidades indígenas. No necesariamente una población califica en eso, porque las poblaciones también tienen sus alcaldes, sus autoridades electas democráticamente, que son las que defienden a estas poblaciones” precisó.
“Y esto normalmente se da en las comunidades amazónicas donde hay pueblos no contactados o comunidades -que si bien están dentro de una demarcación territorial- no necesariamente tienen autoridades representativas que puedan hacer defender sus derechos” dijo.
“Lo que se busca en el fondo, el espíritu de esta norma -afirmó Ollanta Humala- es no dejar ningun sector de la población en indefensión” concluyó el jefe de Estado.
http://www.youtube.com/watch?v=pf2WeHWlYwM&feature=player_embedded
Fonte

Os povos indígenas não cabem no atual modelo da esquerda no poder na América Latina e no Brasil


A análise da Conjuntura da Semana é uma (re) leitura das Notícias do Diasítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia. publicadas diariamente no
Sumário
Povos indígenas: Obstáculo ao projeto nacional desenvolvimentista
O caso brasileiro: Tempos difíceis para os povos indígenas
Agronegócio e ruralistas querem varrer do mapa os povos indígenas
O Estado brasileiro é anti-indígena
Povos Munduruku. Um caso emblemático
Povos indígenas contam apenas com suas forças

América Latina. Uma esquerda que vê estorvo nos povos indígenas
Marxismo e liberalismo se aproximam na concepção do modelo da esquerda latino-americana
Tensões no Continente entre povos indígenas e governos

Conjuntura da Semana em frases
Eis a análise.
Povos indígenas: Obstáculo ao projeto nacional desenvolvimentista
“Índio não ‘produz’. Índio vive” – Eduardo Viveiros de Castro
Os povos indígenas são um estorvo ao modelo nacional desenvolvimentista da esquerda latino-americana e brasileira no poder. Esses povos não cabem no projeto da atual esquerda. Mais ainda, são vistos como obstáculo e amarra ao livre desenvolvimento das forças produtivas portadoras do crescimento econômico.
Tributária de um marxismo reducionista que vê as forças produtivas – trabalho e capital – como meio para controlar e transformar os recursos naturais com vistas à produção de bens materiais, base do crescimento econômico, a atual esquerda latino-americana enxerga nos povos indígenas um obstáculo ao pleno desenvolvimento do modelo em curso.
Nesse modelo, as terras, águas, matas, ar, biodiversidade e minérios estão subordinados à lógica produtivista, âncora do crescimento econômico e base da “distribuição de renda”. Na medida em que os povos indígenas ocupam os territórios onde se encontram os recursos vitais para o modelo, devem ser removidos.
É nesse contexto que devem ser interpretadas as tensões que envolvem os povos indígenas em todo o território latino-americano e, particularmente, no Brasil.
O arsenal de emendas constitucionais, portarias, e regulamentações associadas aos grandes projetos e ao braço armado do ruralismo e do Estado – vide o caso do povo Munduruku – ameaça não apenas os territórios, mas a própria integridade física dos povos indígenas.
O ‘Estado de exceção’, na concepção agambiana, chegou aos povos indígenas.
O caso brasileiro: Tempos difíceis para os povos indígenas
O modelo econômico brasileiro é altamente dependente da exploração e exportação de matérias-primas, em especial de commodities agrícolas e minerais. Nessa perspectiva e para viabilizar o modelo, o Estado brasileiro investe pesado em obras de infraestrutura na área de transporte e geração de energia – rodovias, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos, usinas hidrelétricas, linhas de transmissão, dentre outras.
O modelo necessita do total controle do território e na medida em que está ocupado por indígenas ou outros povos tradicionais – quilombolas, pescadores artesanais, ribeirinhas – os mesmos tornam-se um empecilho e precisam ser removidos. Como destaca análise de conjuntura do Cimi, “é muito evidente que os setores político-econômicos anti-indígenas e antidemocráticos, representantes do agronegócio, das mineradoras, das grandes empreiteiras e o próprio governo brasileiro estão articulados e empenhados para ampliar o acesso, o controle e a exploração dos territórios indígenas, quilombolas, dos pescadores artesanais, dos camponeses, de preservação ambiental, dentre outros”.
Para conseguir seus objetivos, diz o Cimi, os setores anti-indígenas adotaram uma estratégia que tem três objetivos centrais:
1 – Inviabilizar e impedir o reconhecimento e a demarcação das terras indígenas;
2
– Rever procedimentos de demarcação de terras indígenas já finalizados;
3
– Invadir, explorar e mercantilizar as terras demarcadas, que estão na posse e sendo preservadas pelos povos indígenas, pelos quilombolas e por outros grupos tradicionais.
Agronegócio e ruralistas querem varrer do mapa os povos indígenas
É nesse contexto que se assiste ao uso de diferentes instrumentos político-administrativos, judiciais e legislativos para derrogar os frágeis direitos indígenas. A artilharia é pesada e visa atingir os objetivos citados anteriormente. Entre as principais iniciativas dos ruralistas para o desmonte dos direitos indígenas e com o explicito objetivo de “abrir a porteira” dos seus territórios destacam-se:
PEC 215: O projeto de emenda constitucional propõe transferir do Poder Executivo para o Congresso Nacional a demarcação e homologação de terras indígenas e quilombolas, além de rever os territórios com processo fundiário e antropológico encerrado e publicado;
PEC 38: Dá ao Senado Federal competência para aprovar processos de demarcação de terras indígenas e determina que a demarcação de terras indígenas ou unidades de conservação ambiental respeite o limite máximo de 30% da superfície de cada estado;
PEC 237: Permite a posse indireta de terras indígenas por produtores rurais. A PEC acrescenta um parágrafo à Constituição para determinar que a pesquisa, o cultivo e a produção agropecuária nas terras tradicionalmente ocupadas pelos índios poderão ocorrer por concessão da União, tendo em vista o interesse nacional;
Projeto de Lei 1610: Prevê a mineração em terras indígenas, ou seja, a exploração mineral poderá ocorrer em todo e qualquer espaço no interior da terra indígena.
Nas últimas semanas os ruralistas voltaram à carga com sua virulência para paralisar a já quase inexistente demarcação de territórios de ocupação tradicional.
Os povos indígenas como diz Tatiana Bonin se transformaram em “ervas daninhas” que incomodam os “jardins do latifúndio”. O caso do povo Kaiowá Guarani no Mato Grosso do Sul é emblemático nessa perspectiva. Faz parte de sua vida cotidiana a queima de barracos, intimidações, destruição de plantações, sequestros e assassinatos seguidos até mesmo da crueldade do desaparecimento de corpos como se viu com o cacique Nísio Gomes.


O Estado brasileiro é anti-indígena
Os povos indígenas, porém, não enfrentam apenas o agronegócio, enfrentam também o governo que tem direcionado seu arsenal de instrumentos jurídicos para derrotar os indígenas quando se trata de defender o seu modelo. Dentre as principais iniciativas do governo destacam-se:
Portaria 303: De iniciativa da Advocacia-Geral da União (AGU), a portaria confirma o entendimento do STF de que os direitos dos índios sobre as terras não se sobrepõem aos interesses da política de defesa nacional, ficando garantida a entrada e instalação de bases, unidades e postos militares no interior das reservas. A expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas e de “riquezas de cunho estratégico para o país” também não dependerão de consentimento das comunidades que vivem nas TIs afetadas, de acordo com as regras;
Decreto nº 7.957/13: Cria a Companhia de Operações Ambientais da Força Nacional de Segurança Pública, tendo como uma de suas atribuições “prestar auxílio à realização de levantamentos e laudos técnicos sobre impactos ambientais negativos”. Na prática significa a criação de instrumento estatal para repressão militarizada de toda e qualquer ação de comunidades tradicionais, povos indígenas e outros segmentos populacionais que se posicionem contra empreendimentos que impactem seus territórios. Foi o que se viu na Operação Tapajós;
Portaria Interministerial 419/11: Regulamenta a atuação de órgãos e entidades da administração pública com o objetivo de agilizar os licenciamentos ambientais de empreendimentos de infraestrutura que atingem terras indígenas.
Logo, a postura do governo em relação aos povos indígenas é clara, ou os povos indígenas submetem-se ao modelo ou sentirão a mão pesada do Estado. Como diz Márcio Santilli, “o atual governo é o primeiro a renunciar à responsabilidade histórica e à obrigação constitucional de tutelar os direitos das minorias, cujo destino foi relegado às correlações locais de força e à sanha dos seus inimigos”.
Portanto, a atitude do governo brasileiro não é de descaso, omissão e negligência para com os povos indígenas – o governo tem um lado nesse debate e o seu lado é a defesa do seu projeto. Quem estiver atrapalhando será posto de lado como se viu, para ficar em alguns casos, com os povos Truká (Transposição do S.Franciso), povos indígenas do Xingu (Usina de Belo Monte), Povo Munduruku (Complexo Tapajós), Aldeia Maracanã (Copa do Mundo).
As próximas ameaças que avizinham contra os povos indígenas é a da mineração e exploração de petróleo. Existem 152 terras indígenas na Amazônia potencialmente ameaçadas apenas por projetos de mineração.
Povos Munduruku. Um caso emblemático
O que acontece com os povos Munduruku é elucidativo do que é estratégico para o Estado. Nas últimas semanas o governo autorizou o desembarque de tropas da Força Nacional de Segurança Pública na região de Itaituba (PA) para a execução da Operação Tapajós sem qualquer diálogo com os povos Munduruku que estão na região desde tempos imemoriais, inclusive em reservas demarcadas.
A operação Tapajós “se dá no contexto de criar garantias para a execução do complexo hidrelétrico do Tapajós”, diz o antropólogo Roani Valle em entrevista à IHU On-Line. “Todos com quem converso – diz ele – indígenas, movimentos sociais, intelectuais, acadêmicos, organizações não governamentais etc batem nesta mesma tecla”. O antropólogo comenta que “para o governo, a presença militar se faz necessária para reprimir qualquer possível reação do povo Munduruku contra a implementação do Complexo Hidrelétrico do Tapajós”.
O antropólogo Roani Valle – sugerimos a leitura de sua entrevista – destaca que “quem está decidindo por um conflito, com implicações talvez genocidas que se avizinha toda vez que um fuzil FAL, AR 15 ou HK 33 é apontado para uma flecha, é o governo brasileiro”. Nesse sentido, diz ele, “é possível falarmos num escalonamento para uma guerra de baixa intensidade em instalação ou já instalada. Esta doutrina militar desenvolvida em Washington nos anos 1970 envolve terror, humilhação, coerção, ameaça, supressão de acesso a recursos naturais e dos próprios recursos, controle da acessibilidade e deslocamento físico-espacial, supressão informacional e conflitos armados sub-reptícios, camuflados (como o de operações para coibição de crimes ambientais), pontuais e rápidos com ações localizadas e orientados para obterem o máximo de impacto emocional e simbólico em suas vítimas, é covarde mas extremamente eficiente”, destaca.
A Operação Tapajós é demonstrativa de como o governo trata os povos indígenas. Ao contrário do diálogo acenado pelo mecanismo da Consulta Prévia, o governo utiliza a força. A mesma força utilizada contra os povos indígena da Aldeia Maracanã.
Comenta o antropólogo Roani Valle: “Fato é que estamos vivendo tempos difíceis, sobretudo para os povos indígenas e populações tradicionais, e pode piorar. Mas são escolhas. E escolhas não são inexoráveis por natureza; algumas podem ser irreversíveis, como é o caso das hidroelétricas. Terríveis irreversibilidades escolhidas por poucos e impostas a muitos com o argumento falacioso da inevitabilidade desenvolvimentista necessária”.
Povos indígenas contam apenas com suas forças
Os povos indígenas resistem como historicamente resistiram. Faz poucos dias deram um belo exemplo de sua resistência ocupando o parlamento para bloquear a ofensiva ruralista e a PEC 215.
Na sua luta contra os ruralistas e contra a insensibilidade do governo contam com poucas forças, entre elas, a principal é o Cimi e algumas ONG’s. Os partidos de esquerda não apoiam a luta indígenas, apenas alguns parlamentares isolados, há inclusive partidos de esquerda que são claramente anti-indígenas como o PCdoB. O movimento sindical sequer conhece a luta indígena e raramente se posiciona quanto aos seus conflitos.
A frustração com o governo é grande. Na opinião de Roberto Antonio Liebgott, vice-presidente do Conselho Indigenista Missionário – Cimi do Rio Grande do Sul, “a ‘esquerda’ que assumiu o poder se tornou volátil, ou seja, diante das contingências do momento e da ânsia por assumir o governo, ajustou muito rapidamente seus propósitos e bandeiras históricas”. As opções do governo acabaram sendo “pelo boi, pela soja, pelo agronegócio, pelas empreiteiras e empresas de energia elétrica (os barrageiros)”, destaca o dirigente do Cimi.
Toda a insatisfação dos povos indígenas ficou latente quando na semana passada não conseguiram audiência com a presidente. Afirmaram os povos indígenas em carta pública: “Perdemos as contas de quantas vezes em que Dilma esteve com latifundiários, empreiteiras, mineradores, a turma das hidrelétricas. Fez portarias e decretos para beneficiá-los e quase não demarcou e homologou terras tradicionais nossas. Deixou sua base no Congresso Nacional entregar comissões importantes para os ruralistas e seus aliados”.
América Latina. Uma esquerda que vê estorvo nos povos indígenas
A pressão sobre os recursos naturais e as tensões com os povos indígenas não é uma particularidade do Brasil. Em todo o continente latino-americano assiste-se a projetos – de mineração e energia – que pressionam verdadeiros santuários ecológicos, intactos e protegidos.
Com maior ou menor intensidade, em toda a América Latina, movimentos indígenas, camponeses e organizações socioambientais estão se posicionando e se mobilizando contra a execução de megaprojetos – rodovias, hidrelétricas, expansão do agronegócio, mineração, petróleo. No cerne da tensão entre os movimentos sociais e os governos progressistas na América Latina encontra-se a agenda ambiental.
A esquerda latino-americana é cada vez menos “vermelha” e cada vez mais “marrom”. Está ficando cada vez mais claro que os governos progressistas ou da nova esquerda se apoiam na exploração de commodities para alimentar o crescimento econômico. Por esse processo, o continente latino-americano reforça sua histórica condição de provedor de matérias primas para a globalização.
Rompe-se o diálogo com o movimento verde, e a esquerda de vermelha transforma-se em marrom. O vermelho, cor símbolo da luta socialista, subordina-se à lógica do grande capital e, assumindo o modelo extrativista – primário exportador –, provoca grandes impactos ambientais. O marrom é uma referência às crateras a céu aberto provocadas pelos megaprojetos em curso em todo o continente.
Havia a esperança de que a esquerda no poder mudasse o tratamento dado a esses temas e, sobretudo, desse um lugar diferenciado aos povos indígenas, transformando-os em verdadeiros e reais protagonistas de um novo modelo de desenvolvimento, mais respeitável com o meio ambiente e, sobretudo, com os povos que vivem e dependem de seu território. Mas, a questão de fundo não resolvida é que a esquerda no poder no continente continua tributária de um modelo desenvolvimentista baseado na exploração de commodities. É inerente a esse modelo não saber o que fazer com aqueles que se opõem a ele.
Havia a novidade dos países andinos – Equador e Bolívia, sobretudo –, e o reconhecimento nesses países da contribuição indígena para a política, a economia e a cultura. Os acontecimentos nesses dois países são um duro golpe aos que acreditaram que algo novo estava emergindo.
Marxismo e liberalismo se aproximam na concepção do modelo da esquerda latino-americana
Essa esquerda – que se consolida no poder no continente, é verdade – continua presa a uma leitura de um marxismo que se reduz à lógica produtivista, onde o importante é o desenvolvimento das forças produtivas e o crescimento da economia. Aproximam-se do liberalismo, que também quer o desenvolvimento das forças produtivas. Distanciam-se apenas no instrumento de alavancagem do capital: para os primeiros, esse papel cabe ao Estado; para os segundos, ao mercado. Nessa lógica os indígenas não têm vez, porque são considerados um atraso e um freio ao desenvolvimento das forças produtivas. Ela sofre, como chama a atenção Valter Pomar, de um “déficit teórico”, não apenas no que diz respeito ao desenvolvimento e à integração regional, mas também e especificamente em relação ao lugar dos povos indígenas.
O modelo extrativista patrocinado pelos governos de esquerda e, também, pelos de direita na América Latina é definido pelo escritor uruguaio Raúl ZibechiEdgardo Lander como “apropriação dos bens comuns, direta ou indiretamente, para transformá-los em mercadorias”. O sociólogo venezuelano comenta que “a principal fonte das contradições internas e das decepções com relação aos governos progressistas e de esquerda é que parecem, de fato, dar por óbvio que não há nenhum outro caminho possível senão o de um sistema baseado no crescimento econômico”.
Em praticamente todos os países da região, desde o México até o Chile, povos indígenas, comunidades tradicionais e camponesas estão se levantando contra grandes projetos de desenvolvimento e de extração natural que, pegando carona no boom econômico da América Latina e nos altos preços das commodities, estão promovendo uma nova febre do ouro em paisagens tão distintas como o deserto mexicano e a floresta amazônica.
A obsessão pelo crescimento, a aposta em megaprojetos e a flexibilização do aparato normativo que protege o meio ambiente estão no cerne das tensões sociais que se assiste em todo o continente. Tome-se como exemplo o que vem acontecendo no Equador, no Peru e na Bolívia, mas também com grau diferenciado na Argentina, no Chile, na Colômbia e na Venezuela. Marchas, protestos, ocupações e mobilizações fazem parte do cenário da luta social na América Latina nos últimos anos e, na maior parte delas, o arranque das mobilizações são os conflitos ambientais ancorados na mineração. Assiste-se, pois a um ressurgimento dos povos indígenas na América Latina, que se postam como novo movimento social, ancorado numa outra cosmovisão, que se manifesta em outra concepção de desenvolvimento.
Tensões no Continente entre povos indígenas e governos
Revelam-se a pedra no sapato dos governos que insistem em perseguir velhos caminhos, em vez de ousar abrir novas trilhas. A seguir, vamos ilustrar como essas tensões acontecem em vários países da América Latina, com ênfase nos conflitos dos setores da mineração e energia.
Bolívia. Embora o presidente indígena Evo Morales tenha se destacado como um grande crítico do capitalismo e seu vice-presidente tenha destacado que “não haverá nunca mais uma Bolívia sem índios”, muitas das resistências que seu governo vem enfrentando vêm justamente de parcelas sociais que criticam sua administração por seguir uma política econômica ortodoxa, pouco inovadora no tratamento dado às questões que envolvem os recursos naturais e na valorização dos indígenas. Os indígenas bolivianos não hesitam em fazer oposição a um governo liderado por um quéchua quando seus interesses são contrariados. A oposição à proposta governamental de construção de uma estrada atravessando o Território Indígena e Parque Nacional Isiboro Sécure (TIPNIS), teve repercussão mundial e levou o governo a suspender a obra e submeter o projeto a consulta. No final do ano passado, começou o processo de consulta. A maioria das comunidades consultadas aprovou a construção da estrada transamazônica, mas o referendo está sendo questionado pelos opositores por não ter sido universal.
No departamento de Tarija a ameaça aos povos indígenas vem do subsolo. Ali foram descobertas reservas de hidrocarbonetos e há projetos de extração, o que acaba prejudicando as comunidades indígenas que vivem na área. Ao longo do segundo semestre de 2012, foram muitas as mobilizações, bloqueios de estradas ou de campos petroleiros e a participação em pequenas ou grandes marchas, para exigir que os guarani, no caso, sejam consultados sobre os projetos.
Equador. O Equador, assim como a Bolívia, fez uma nova Constituição com vistas a contemplar direitos à natureza. Rafael Correa oscila entre a não exploração do petróleo no Parque Nacional Yasuni (em troca do pagamento dos chamados serviços ambientais), na selva amazônica, região rica em biodiversidade, e a exploração de recursos naturais para o desenvolvimento. No final do ano passado, os planos oficiais de extração de recursos naturais novamente colocaram o presidente do Equador, Rafael Correa, em disputa com líderes indígenas do país. A causa desta vez foi o novo processo de licitação internacional para a exploração do petróleo em larga escala na Amazônia equatoriana que o governo do país acaba de iniciar. Em fevereiro passado, após sua reeleição, Correa voltou a defender a exploração do petróleo.
Correa tem projetos, também, de alavancar a exploração mineradora, em larga escala, atividade pouco desenvolvida até agora no Equador, o que vem despertando preocupações e atritos com as comunidades indígenas implicadas.
Peru. No Peru, a maioria dos conflitos sociais que eclodiu no governo de Ollanta Humala tem origem na mineração, especialmente, do ouro. O centro das atenções se volta para o projeto de mineração Conga, na região de Cajamarca. Até julho do ano passado, os conflitos envolvendo as forças da ordem e o movimento social já tinham produzidos um rastro de mais de 15 mortos. Em janeiro foi a vez da comunidade de San Juan de Cañaris, no norte do país, mostrar seu desacordo com um projeto de mineração a céu aberto do país. Os moradores reclamam a colocação em prática da consulta prévia aos povos indígenas.
O Peru é o segundo maior produtor de prata e cobre e sexto maior produtor de ouro do mundo. Estão previstos investimentos de cerca de 54 bilhões de dólares na área da exploração mineral. Desamparados, os povos indígenas recorrem aos tribunais internacionais para reivindicarem o direito de consulta sobre exploração mineral e petrolífera em seus territórios.
Chile. No Chile, o cenário difere no objeto, mas não na matéria. Na Patagônia, os movimentos sociais, entre eles os Mapuche, se debatem contra a construção de hidrelétricas. Em maio de 2011, o governo de Sebastián Piñera aprovou a construção de cinco hidrelétricas na região, extensivamente habitada. As empresas interessadas são estrangeiras, que querem produzir energia a ser transportada até os grandes consumidores – empresas mineradoras, especialmente as indústrias de cobre –, que ficam a mais de 2.300 km de distância. A região é rica em água e pode estar sofrendo um novo colonialismo.
Indígenas huascoaltinos, na fronteira com a Argentina, se opõem ao Projeto Pascua Lama, iniciado há dez anos, de exploração de ouro. Os índios dizem arcar com prejuízos ambientais causados pelo empreendimento e denunciaram o Estado chileno na Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
Argentina. Da mesma maneira, também a Argentina, que condivide a Patagônia com o Chile, assenta suas esperanças de protagonismo energético nessa região. Em novembro de 2011, a petrolífera Repsol-YPF anunciou o descobrimento de gás e de petróleo não convencional em terra, em uma área conhecida como Vaca Muerta (“Vaca Morta”), na província patagônica de Neuquén.
Os índios Mapuche das comunidades de Mellao Morales e Huenctru Trawel Leufú, também em Neuquén, tentam, desde 2008, anular um contrato para exploração de cobre dentro de suas reservas. Segundo eles, a extração do metal viola legislações indígena e ambiental. As obras foram paralisadas por decisões judiciais até que eles sejam consultados.
Já a população de Famatina, na província de Rioja, junto à Cordilheira dos Andes, e o povo da vizinha Chilecito, se organizaram, em janeiro de 2012, com vistas a impedir o acesso à área onde a mineradora canadense Osisko Mining pretende extrair ouro e outros minérios, usando milhões de litros de água misturada com cianeto e soda cáustica. Eles temem que o uso de cianeto contaminará as águas da região, e seus efeitos poderão atingir fontes hídricas que atravessam a Argentina, podendo chegar até o rio Paraná.
(Ecodebate, 24/04/2013) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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segunda-feira, 29 de abril de 2013

Indígenas se mobilizam em defesa da educação em Dourados

Os indígenas de Dourados somam forças na luta por uma educação de qualidade. Nas aldeias, as escolas funcionam em locais improvisados, falta estrutura, e ainda enfrentam o problema das estradas intransitáveis. A dificuldade para chegar às salas de aula, devido a essas condições, reflete diretamente na educação, segundo avaliação das lideranças.

O fechamento do núcleo indígena na Secretaria de Educação – Semed – também foi um problema relacionado por eles. Segundo informações, o núcleo tinha representantes das três etnias existentes no município e o encerramento prejudicou os direcionamentos da política indígena.

Os educadores, também com apoio da comunidade indígena, aderiram a greve e além de estarem incluídos em todas as reivindicações gerais da categoria, pedem a ampliação das salas nas escolas indígenas, concurso específico, transporte escolar melhor, PCCR (Plano de Cargos Carreiras e Remunerações) diferenciado, inserção de alunos nos programas sociais, como o Nace (Núcleo de Arte, Cultura e Esporte), o que ainda não foi realizado, de acordo com eles.

De acordo com o Simted (Sindicato dos Trabalhadores Municipais em Educação) de Dourados, os indígenas não medirão esforços para colaborar com a educação de qualidade no município. Para o presidente, João Azevedo, esse apoio é essencial.

Nesta manhã, 29, eles estão panfletando na MS 156 para conscientização da população sobre a greve, tanto para indígenas quanto para não indígenas. 

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sexta-feira, 26 de abril de 2013

HÁNAITI HO’ ÚNEVO TÊRENOE (GRANDE ASSEMBLEIA DO POVO TERENA)


HÁNAITI HO’ ÚNEVO TÊRENOE
(GRANDE ASSEMBLEIA DO POVO TERENA)


Acampamento Terra Vida – Terra indígena Buriti/MS
8 a 11 de maio de 2013


PROGRAMAÇÃO

Dia 8 – Quarta-feira
17:00 hs – chegada
19:00 hs – Abertura e noite Cultural:
·         Mesa das lideranças indígenas
·         Momento de reza tradicional
·         Dança Kohixoti Kipáe
·         Dança Siputrema
·         Vídeos – Imagens da luta do movimento indígena
(cada comunidade deve preparar uma apresentação cultural uma dança, uma música e etc...)

Dia 9 – Quinta-feira: TEMA – Questão fundiária e luta pela terra
7 hs – Café da manhã
8 hs – Questão Fundiária - conjuntura nacional da luta dos povos indígenas
·         Portaria AGU 303 e PEC 215
·         Projeto de Lei 1.610/96 – Mineração em terras indígenas
·         Ministério Público Federal – MPF – Procurador da República Dr. Emerson Kalif
·         Situação das terras do Povo Terena, Kadiwéu, Kinikinau e Ofaié (HO’ ÚNEVO TÊRENOE)
·         Sra. Marta Azevedo – Presidenta da FUNAI  
·         Situação jurídica das terras indígenas Guarani e Kaiowá
- Conselho Aty Guasu Guarani Kaiowá
·         APIB
·         CIMI
·         A política indigenista e Convenção 169 OIT
·         Secretaria de Articulação Social da Presidência da República
·         Questão da segurança nas aldeias
·         Equipe técnica federal dos direitos humanos

19:00 hs Janta
20:00 hs – Apresentação Cultural Guarani/Kaiowá



Dia 10 – Sexta-feira: TEMA - Educação escolar indígena

7:00 hs  - Café da manhã
8:00 hs – Educação escolar indígena
·         Representante indígena do Conselho Nacional de Educação no MEC
·         Secretaria Estadual de Educação
·         Secretarias municipais de educação
·         Representante dos Povos do Pantanal no MEC
·         Representante Guarani Kaiowá no MEC

19:00 hs Janta
20:00 hs – Apresentação Cultural

Dia 11 – Sábado: TEMA – Saúde indígena

7:00 hs  - Café da manhã
8:00 hs – A saúde indígena em debate
·         Representante SESAI/Brasília
·         Representante SESAI/MS
·         Representantes dos Pólos base de saúde
·         CONDISI
·         Secretaria Municipal de saúde
·         Representantes do Conselho Local de saúde indígena
·         Comissão de saúde da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul

12:00 -  Almoço

13:30 – Encaminhamento Final
·         CNPI
·         Conselho dos Povos indígenas e sua organização
·         Documento Final


Realização:
HÁNAITI  HO’ ÚNEVO TÊRENOE
CONSELHO DO POVOTERENA

Apoio:
Conselho Aty Guasu
CIMI
NEPPI/UCDB
Rede de Saberes/UCDB
Dep. Pedro Kemp
FUNAI
Informações: Luiz-eloy@hotmail.com ou (67) 9616-8645 (Luiz Eloy)

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Jovem é primeira mulher indígena a tornar-se advogada em MS

 
A jovem Kadiwéu Carla Mayara Alcântara Cruz foi aprovada na última prova da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e tornou-se a primeira advogada indígena de Mato Grosso do Sul. 
O estado tem a segunda maior população indígena do país - cerca de 72 mil pessoas de oito etnias diferentes. Atualmente, contando com Carla, há apenas quatro advogados indígenas. Ela foi a primeira mulher indígena a conseguir o título.
Filha de mãe Terena e pai Kadiwéu, a advogada nasceu e cresceu na aldeia Kadiwéu Alves de Barra, que pertence ao município de Porto Murtinho. 
A oportunidade de ingressar no Ensino Superior aconteceu quando a mãe, professora, conheceu o historiador Antônio Brand durante um curso de capacitação. “O professor Brand disse para a minha mãe que estava começando um projeto de apoio a acadêmicos indígenas na UCDB (Universidade Católica Dom Bosco) e sugeriu que eu viesse estudar em Campo Grande”, explica. Carla ingressou no curso de Direito em 2004 e foi uma das pioneiras no desenvolvimento do projeto Rede de Saberes de apoio à permanência de acadêmicos indígenas no ensino superior. Concluiu a graduação em 2009. 
Segundo Carla, os desafios passaram pela adaptação à cidade até à dificuldade com as matérias “uma das principais dificuldades dos acadêmicos indígenas é a língua. Estamos mais acostumados com nossas línguas tradicionais, então ás vezes é mais difícil compreender os conteúdos. Além disso, a rotina da faculdade é muito diferente, a adaptação foi complicada. 
Na época éramos poucos indígenas na UCDB, no máximo dez. Eu consegui superar graças ao professor Brand e o projeto Rede de Saberes. Os cursos de extensão e monitorias e também os encontros ajudaram muito”.
Passar no exame da Ordem foi o último desafio para realizar o sonho de ser advogada. “Agora eu pretendo advogar em prol dos indígenas. O direito indígena ainda é muito desconhecido pelos profissionais da área, muitos não sabem como aplicar. Quero continuar estudando. Fazer mestrado, doutorado e ajudar minha comunidade”, afirma.

Projeto Rede de Saberes

O Rede de Saberes é um projeto de apoio à permanência de indígenas no ensino superior viabilizado com recursos da Fundação Ford. Teve início em 2005 e é uma parceria entre a UCDB por meio do Núcleo de Estudos e Pesquisas das Populações Indígenas (NEPPI), a Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul de Aquidauana (UFMS). 
Ele estimula e orienta a iniciação científica, tem laboratório de informática e oferece cursos de extensão e monitorias. O coordenador geral é o professor Antônio Hilário Aguilera (UFMS). Na UCDB, o projeto é coordenado pela professora Eva Ferreira e atualmente atende 85 acadêmicos indígenas. 
Equipe de Comunicação e Design NEPPI/UCDB

Jovens indígenas enfrentam cidade para conquistar diploma universitário

EXPRESSO MT

"Quando nos apresentamos e dizemos que somos indígenas, todos perguntam se andamos nus, moramos em ocas, até os professores universitários. Claro, ainda existem etnias que, por serem afastadas e não ter contatos com os brancos, ainda vivem em ocas, têm costumes mais restritos. Mas já tem indígenas que moram em cidades, não são mais ocas, já são casas tradicionais. Também têm aldeias já com internet, telefone. A gente teve que acompanhar as coisas, porque, para você sair da aldeia e ir para ir a universidade sem conhecer telefone, computador, não tem como". O depoimento é de Rodolfo Edvan Moreira, 22 anos, da tribo Kaimbé, um dos 9.756 indígenas brasileiros que cursam o ensino superior.
Em lembrança ao dia do índio, comemorado nesta sexta-feira (19), o G1 conversou com dois jovens universitários indígenas que hoje vivem em uma residência instalada no campus da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs). Entre os relatos, eles falam da vontade e da importância de se manter os costumes e tradições, contam histórias da vida na cidade e falam do preconceito que ainda enfrentam "em plena época que estamos", como diz Rodolfo.
Estudante do 5º semestre do curso de Administração da Uefs, o rapaz é integrante da tribo Kaimbé, situada região de Euclides da Cunha, norte da Bahia. Lá, vivem sua mãe, uma irmã de nove anos e o padrasto. "A aldeia tem 1.256 kaimbés e uma estrutura mais próxima da cidade, mas mantendo as tradições. Lá, eu estudei até o 3º ano. Senti a necessidade de fazer uma faculdade porque o cacique recebe projetos do governo e não tinha quem orientasse, interpretasse os projetos da forma que eles vinham. Daí vim fazer Administração", explica.
Segundo Rodolfo Moreira, geralmente os jovens indígenas que fazem um curso superior em centros urbanos voltam às aldeias para desenvolver o conhecimento na comunidade. "Nós falamos à aldeia que voltaremos para colocar o que aprendemos em prática, é uma forma de manter o nosso vínculo", diz. Além disso, segundo Rodolfo, há a possibilidade de trabalhar na Fundação Nacional do Índio (Funai), como "um braço entre o governo e as comunidades".
No caso de Rafaela Madalena, 26, o curso de enfermagem servirá para levar a medicina à sua aldeia, o Tuxás Morrinhos, em Ibotirama, oeste da Bahia. "Eu cheguei a começar o curso de medicina na Bolívia, mas aí apareceu a oportunidade de cursar a universidade no Brasil com as cotas e decidi voltar pela proximidade da minha aldeia, da família", conta. Na comunidade da jovem, vivem cerca de 100 famílias.
Preconceito
Sobre a rotina na cidade, um dos principais pontos enfrentados pelos jovens indígenas é, ainda, o preconceito. "Tanto por parte da sociedade e de colegas de turma quanto por professores. A gente espera que o professor seja mais 'mente aberta', conhecedor, tenha respeito pela história. Mas você ainda vê certo professor com olhar diferente, é lamentável", reclama. Segundo ele, o preconceito é perceptível em sala de aula, por exemplo, quando os indígenas ficam isolados, com pouco contato com os "brancos".
"Tem gente que faz o contrário, graças ao pai Tupã, gente que acolhe. Mas o preconceito ainda é grande, mesmo. A gente vê também que grande parte disso vem de outras classes consideradas como minorias, que não nos reconhecem como indígenas, como parte da história do país", pontua. Segundo o rapaz, nessas ocasiões, eles tentam interagir e realizar ações conjuntas para passar a cultura e mostrar que "todos são brasileiros".
"A gente não pode deixar para trás as tradições, tem que sempre a levar aonde formos, independente de universitários ou analfabetos, as tradições precisam existir. E o preconceito que ainda tem na sociedade e na universidade é muito atuante. Um "pré" conceito que as pessoas têm sobre indígenas pela falta de conhecimento do que nós somos, da nossa história. Isso precisa ser revisto sempre com políticas públicas e com a inicativa de cada um", avalia Rafaela.
Residência
Desde 2010, a Uefs tem uma residência universitária para a população indígena. "É um local mais afastado, em uma área de matas, com várias árvores, onde podemos seguir os nossos costumes e rituais com um pouco mais de tranquilidade", explica Rodolfo. Atualmente, segundo os estudantes, há 19 índios no local, divididos em 11 mulheres e oito homens, de seis etnias diferentes.
Por conta das várias etnias em um mesmo ambiente, segundo o rapaz, "não pode se dizer que se vive em um mar de rosas". "Isso é normal, porque cada um tende a defender os interesses de sua etnia, de sua aldeia, mas nada que atrapalhe a convivência", diz. Segundo ele, reuniões e informes ajudam na manutenção da convivência saudável entre os índios.
Acesso à universidade
Segundo os números do Ministério da Educação (MEC), em 2011, de 6.739.689 pessoas que se matricularam no ensino superior no Brasil, 9.756 eram declarados indígenas. Desse total, 339 mil pessoas se matricularam em universidades e faculdades na Bahia, sendo 505 declarados indígenas.
De acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2010 a população de índios chegava a 817 mil brasileiros, cerca de 0,4% da população.
Os índios estão distribuídos em 688 territórios indígenas catalogados, além de um número não divulgado de povos que tentam junto ao Governo Federal o reconhecimento de suas etnias. Pelo menos 15 etnias indígenas povoam a Bahia, divididos em 56.300 pessoas.
Ser índio
Para Rafaela, ser índio é um desafio." O Brasil é miscigenado, é misturado, mas as pessoas ainda precisam entender isso", desabafa a futura enfermeira. "As pessoas nos conhecem pouco, nos perguntam o que é um índio com frequência. Ser índio é manter sua cultura, suas tradições, tudo que aprendeu com os mais velhos, ensinamentos, rituais, manter viva essa tradição. Porque as pessoas ainda acham que você ainda tem que ficar nu, sair por aí comendo folha, subindo em árvore. Nada contra, nas aldeias ficamos bem mais à vontade, sem essas roupas pesadas. Vamos para a mata, pescamos, mantemos a cultura e isso não temos como fazer na universidade. Mas, pelo menos os rituais, danças, orações, agradecimentos aos deuses da natureza, a gente mantém", comenta o estudante Rodolfo. 
Fonte

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Violência contra indígenas no período militar


Alex Rodrigues
Repórter Agência Brasil

Brasília – Membro da Comissão Nacional da Verdade responsável por coordenar a apuração das denúncias sobre violações aos direitos indígenas entre 1946 e 1988, a psicanalista Maria Rita Kehl informou hoje (22), que a comissão vai analisar todas as denúncias e fatos narrados no chamado Relatório Figueiredo, extenso documento produzido em 1968 e encontrado há poucos dias após mais de 40 anos dado como perdido.
Embora ainda não tenha se debruçado sobre o documento localizado pelo pesquisador e vice-presidente do Grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo, Marcelo Zelic, a psicanalista disse estar convencida de que o relatório de pelo menos 5 mil páginas contém “muitos e importantes relatos de violações”, o que vai exigir uma avaliação cuidadosa para evitar equívocos ou conclusões precipitadas.
“É um documento complexo que vai nos dar muito trabalho. Já estamos prevenidos de que vamos ter que analisá-lo com muito cuidado e discernimento. Ao mesmo tempo em que relata muitas violações aos direitos dos povos indígenas, por se tratar de um relatório elaborado em plena ditadura militar, também traz algumas acusações que vão exigir que procuremos outros subsídios para avaliar [as denúncias] sem nos precipitarmos”, disse a psicanalista.
Produzido entre os anos de 1967 e 1968, quando o então procurador Jader de Figueiredo Correia percorreu o país a convite do extinto Ministério do Interior para apurar denúncias de crimes cometidos contra a população indígena, o documento era dado como perdido em um incêndio no ministério há mais de 40 anos e foi recentemente encontrado no Museu do Índio, no Rio de Janeiro, por Zelic.
De acordo com o pesquisador, o relatório foi entregue pela Fundação Nacional do Índio (Funai) ao Museu do Índio em 2008. Distribuído em várias caixas e misturado com outros documentos, não estava catalogado, de forma que, durante décadas, os servidores dos dois órgãos indigenistas não se deram conta de que o que parecia um processo qualquer, era, nas palavras de Zelic,  talvez o “mais importante documento produzido pelo Estado brasileiro a respeito das violações aos direitos indígenas, como a apropriação de suas terras e de seus recursos”.
“É um documento que pode ajudar muito a sensibilizar a sociedade para a situação que os índios ainda hoje vivem no Brasil”, disse Zelic à Agência Brasil. De acordo com o pesquisador, o resgate do Relatório Figueiredo pode ser creditado como um dos avanços possibilitados pela criação da Comissão Nacional da Verdade, criada em maio de 2012, por meio da Lei 12.528 para apurar graves violações de direitos humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988.
Durante o trabalho de apuração, o grupo coordenado por Figueiredo Correia apurou denúncias como o extermínio de tribos indígenas inteiras, torturas, expulsões e diversos tipos de violência, muitas vezes praticada por servidores do extinto Serviço de Proteção ao Índio (SPI), órgão indigenista federal que antecedeu a Funai (criada em 1967) e sobre o qual pesavam suspeitas tão graves que o ex-ministro do Interior, Albuquerque Lima, admitiu, durante depoimento no Congresso Nacional, em 1977, ser impossível manter o órgão “por culpa de algumas dezenas de servidores menos responsáveis”.
Nove anos antes da declaração do ministro e em consequência das informações reveladas pelo trabalho de Figueiredo Correia, o Ministério do Interior recomendou a demissão de 33 pessoas; a suspensão de 17; a cassação da aposentadoria de um agente de proteção aos índios e de dois inspetores e apontou ainda o envolvimento de outras pessoas em práticas ilícitas ou prejudiciais aos índios, mas cuja punição não era de competência do Poder Executivo. Posteriormente, muitos funcionários públicos punidos foram inocentados na Justiça e retornaram ao trabalho.
Filho do ex-procurador, o advogado Jader de Figueiredo Correia Junior comemorou o fato de o relatório produzido por seu pai em meio “a constantes ameaças de morte, alguns atentados” e o peso de ter que pôr a própria família sob proteção policial ter sido localizado.
“É uma notícia fantástica. Não apenas para a família, que vimos o quanto meu pai sofreu para tentar chegar a uma verdade a que, infelizmente, o país não tinha acesso, mas principalmente porque o documento é importantíssimo para o país. A partir dele, parte de história poderá ser reescrita e o Brasil e o mundo poderão enfim ter a exata noção dos crimes cometidos contras os índios durante determinado período”, disse o advogado, acrescentando que, até o pai morrer, quando ele tinha 14 anos, o tema da violência contra os índios era recorrente.
“Muitas pessoas próximas ao meu pai que conheciam o teor do documento, as coisas que ele tinha visto durante suas viagens, a importância e a gravidade dos fatos por ele narrados, não entendiam como o documento podia ter desaparecido. Quer dizer, entendiam. Era algo conveniente para muitas pessoas”, disse o advogado, que ainda hoje lembra de alguns relatos do pai. “Meu pai contava ter chegado a aldeias e encontrado toda a comunidade morta por envenenamento, pelo contato [com os não índios] ou por outros meios. Lembro de ele contar que em uma aldeia o grupo encontrou uma índia amarrada a duas árvores pelos pés, de cabeça para baixo e cortada a facão”.
Edição: Fábio Massalli
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